Desta vez os "papos" constituintes da imagem de marca de Vítor Gaspar não se viram...... Sem pedir licença, três ministros e um secretário de Estado entraram ontem de manhã nas casas e nas empresas dos portugueses marcados por uma característica: eram todos portadores de enormes olheiras, sintoma de uma noite dormida a correr. Ao ter terminado de madrugada o Conselho de Ministros, Aguiar Branco, Marques Guedes, Poiares Maduro e Luís Morais Sarmento não tiveram tempo para um sono retemperador. O cansaço de onze horas de reunião e a estratégia para o anúncio de superesperados cortes na máquina do Estado - essa mesma, a que tem nela pendurados milhões de portugueses - não lhes deu margem, sequer, para um retoque pela via de um qualquer produto de beleza - e não correram o risco, inclusive, de serem acusados de estarem a esbanjar dinheiro em coisa supérflua.
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A criatividade comunicacional para explicar um corte orçamental de 1300 milhões de euros é complexa, admita-se. E é a bastante para se terem gorado parte das expectativas, tanto mais quanto uma percentagem elevada das decisões carece de apoio parlamentar e o recato é o melhor conselheiro, não se dê o caso de os senhores deputados serem os últimos a saber....
Os três ministros e o ajudante de ministro limitaram-se, por isso, a um conjunto de generalidades para todos sossegarem - e sem ultrapassar os 800 milhões de euros. Assim:
Os funcionários públicos e os pensionistas devem ter calma, os acertos de IRS ficam lá mais para diante, só com o subsídio de Natal - um sinal de que ainda haverá país na altura.
Os detentores do usufruto das parcerias público-privadas de âmbito rodoviário, atenção!, vão ter de baixar o fartote de margens de lucro garantido, mas com calma. Só se não se portarem bem estarão ameaçados por uma taxa. E as ameaças sabe-se como são....
Sim, disseram eles, os ministérios vão ter de pôr-se finos e emagrecerem os gastos de gestão em 600 milhões de euros. Nada de relevante foi especificado, pede-se serenidade, mas um dado é adquirido: os chefões e os chefes daqui e dali vão ter de explicar como o dinheiro é gasto em vertentes mais opacas: cartões de crédito, abonos disto e daquilo, e se não o fizerem ficam ameaçados. Ora cá está algo de preocupante: o Governo, o atual como os anteriores, não sabe ao certo o valor dos nossos impostos destinado a pagar aos funcionários do Estado. Já não é mau conhecer-se a disponibilidade para colocar fim à roda livre...
A vida é assim.
As más notícias, é dos cânones, não devem ser dadas de supetão a quem por via delas verá prejudicada a sua vida ou a dos seus familiares. As olheiras de ontem dos três ministros e do secretário de Estado acabam, enfim, por derivarem do tal cansaço mas também de preocupações sérias.
Têm de ser tratados com pinças os cortes orçamentais, os de 1,3 milhões mais os seguintes, os dos célebres quatro mil milhões, igualmente já combinados com os credores mas cujo anúncio precisa de um efeito conta-gotas - nele incluído o apelo ao consenso das forças políticas e sociais.
Não há nada como viver-se um momento de ilusão. Agradeça-se, então, aos esforçados membros do Governo a sua comunicação mal dormida de ontem. Piores dias virão.