As opiniões não vinculam o círculo
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A redução do número de candidatos ao Ensino Superior, para o ano letivo de 2025-2026, apanhou o país de surpresa. Apenas 81,9% das vagas foram ocupadas, cerca de 45 290 colocações, segundo a Direção-Geral do Ensino Superior. Esta quebra não se explica por razões demográficas, já que nos últimos dez anos houve tendência geral de declínio, mas não houve uma perda brusca da população jovem. As causas são sobretudo conjunturais e prendem-se com as mudanças introduzidas no regime de conclusão do Ensino Secundário, que passou a exigir três exames nacionais: português e duas disciplinas à escolha do aluno.
A par disso, as dificuldades económicas, o custo da habitação, a escassez de residências e as limitações da ação social estudantil, embora relevantes, terão tido um impacto secundário face à mudança abrupta das regras de acesso. Contudo, torna-se urgente compreender o que aconteceu nos exames do Secundário. Vamos a factos: o número potencial de candidatos ao Ensino Superior pode ser estimado pelos inscritos e aprovados a português (83 mil inscritos, 77 mil presentes e 63 mil aprovados), mas apenas cerca de 50 mil formalizaram candidatura. A comparação com 2024 revela ainda um aumento expressivo das reprovações em quase todos os exames, exceto português e biologia/geologia, e uma descida acentuada das médias em 10 das 12 provas com maior número de alunos. Estes dados exigem uma reflexão séria sobre as consequências das alterações introduzidas e sobre o impacto que poderão ter na equidade e na inclusão futuras no Ensino Superior português.
Mas é no território que os efeitos se fazem sentir de forma mais severa. A quebra no número de estudantes foi particularmente acentuada no Interior, ou suas vizinhanças. O Politécnico de Tomar e o da Guarda estão entre os casos mais preocupantes, com reduções de 32,3% e 34,5%, respetivamente. Muitas instituições registam hoje taxas de ocupação inferiores a 70%, o que compromete a sua sustentabilidade e ameaça a continuidade de cursos.
As consequências ultrapassam o domínio do ensino. Ter menos estudantes significa ter menos vida económica local, menos arrendamento, menor consumo, menor procura de serviços e menor dinamismo cultural. Quando o conhecimento se afasta, o território empobrece. A perda de jovens qualificados acentua a desertificação, o despovoamento e o envelhecimento, conduzindo à desqualificação das regiões interiores e à perda de massa crítica.
É justo reconhecer que, nos últimos anos, o Estado procurou contrariar esta tendência. Foram criados incentivos fiscais para atrair estudantes ao Interior, como deduções no IRS, majorações nas despesas de educação e complementos de alojamento, bem como programas específicos como o +Superior, lançado em 2017-2018, e bolsas de ação social cofinanciadas por fundos nacionais e europeus. No entanto, apesar dessas medidas, o ano letivo de 2025-2026 aconteceu.
O Ensino Superior continua a ser um poderoso motor de mobilidade social. Quem tem uma licenciatura aufere, em média, mais 49% do que quem possui apenas o Ensino Secundário, e o salário real dos jovens diplomados aumentou 7% entre 2022 e 2023. A qualificação continua a ser o passaporte mais seguro para um futuro melhor e, ao mesmo tempo, a âncora do desenvolvimento equilibrado do território.
A coesão territorial não se decreta. Constrói-se através do conhecimento, da ciência e da valorização das pessoas. As instituições do Interior precisam de ser vistas não como periferia, mas como polos estratégicos de inovação, formação e progresso. O país só será verdadeiramente coeso quando a bússola do conhecimento apontar também para o Interior.