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Desde que a democracia é plena que andamos numa missão inacabada: reformar o país. Seja lá o que isso for. Das dores iniciais e ajustes ideológicos pós-ditadura, passando pela adesão à Europa e pela gestão dos muitos milhões que, nas décadas de 80 e 90 do século passado, distribuímos sem grande critério, do virar do milénio e do progressivo esbatimento das diferenças sociais e melhoria generalizada das condições de vida, até aos dias de hoje, do rigor orçamental, da pobreza energética e de uma profundíssima crise de habitação, Portugal nunca soube verdadeiramente responder à sacramental inquietação: que reformas precisamos para darmos o salto? Com relativa facilidade concluímos que temos de evoluir na educação, na justiça, na saúde e na relação dos cidadãos com o Estado, sobretudo no que respeita ao esforço fiscal pedido. Todos os pactos políticos foram feitos em cima desta evidência. E as reformas sendo sussurradas aos nossos ouvidos sempre que havia mudança de turno governamental. Agora é que vai ser. Nunca foi. Provavelmente, nunca será.A clientela que vive refastelada no colo do Estado agradece. Quando olhamos para o bodo que o orçamento da Saúde distribui por tantos beneficiários, não podemos deixar de nos alvoroçar perante a incapacidade deste Governo (e de todos os outros) para tomar decisões impopulares, mas necessárias. A chantagem dos médicos tarefeiros é apenas mais um episódio numa sucessão de extravagâncias. As reformas não têm de ser exercícios de poder grandiloquentes. Por vezes, basta um sinal de força para contagiar o resto. Veremos se Luís Montenegro quer comprar (e, quem sabe, ganhar) essa guerra.

