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Ainda que comum à quase totalidade das candidaturas às câmaras municipais, e vindo a crescer de forma significativa em importância e atenção ao longo dos últimos sufrágios, a saúde não tem sido o tema central da campanha eleitoral das eleições autárquicas que terão lugar em meados do próximo mês de outubro.
Acredito, no entanto, que esta dinâmica de centralidade, que a saúde tem vindo a ganhar, se vai acentuar, elevando-a a ponto privilegiado das atenções dos que nos governam e dos que ambicionam governar-nos, aos diferentes níveis, com o poder local a emergir em protagonismo e em fonte de soluções, nomeadamente nas dimensões associadas à gestão da doença crónica, aos cuidados continuados e, sobretudo, à prevenção e à promoção dos melhores estilos de vida. Tudo isto porque as câmaras municipais e as juntas de freguesia estão mais próximas e podem contribuir para uma prestação de cuidados mais diferenciada e mais personalizada, e porque nós, cidadãos, o vamos cada vez mais exigir.
Como sabemos, e como estamos a sentir, é grande o turbilhão porque está a passar a saúde resultado, em larga medida, da combinação entre a pressão demográfica e a procura de melhores cuidados, com consequências muito preocupantes na escassez de recursos humanos e na garantia da sustentabilidade dos sistemas públicos.
Muito se tem refletido, estudado e escrito sobre este grande desafio, e muito se continuará a fazê-lo, uma vez que as respostas e as soluções são complexas e vão exigir mudanças e alterações disruptivas nos formatos e nos modelos que temos adotado. Esta é uma realidade não só do nosso país, mas de todos os que têm sistemas nacionais estruturados para assegurar esta que será uma das nossas - para os que dela podem usufruir - maiores conquistas civilizacionais.
As respostas e soluções são com efeito complexas e estão a exigir o melhor de nós com intervenções a todos os níveis de onde destacaria: a) a utilização massiva e inteligente da melhor tecnologia que o conhecimento pode dar; b) a incorporação das mais avançadas ferramentas disponíveis ao nível da gestão, onde os recursos humanos são centrais e as tecnologias de informação são instrumentais; c) a generalização da digitalização, potenciando definitivamente o poder dos dados e da inteligência artificial; e d) a alteração, porventura disruptiva, mas certamente cultural, dos paradigmas vigentes, privilegiando ou pelo menos igualando em importância, definitivamente e com as consequências que daí advêm, a doença crónica face à doença aguda e as abordagens de prevenção face às de tratamento.
Certamente que relativamente a todos, mas em especial a este último ponto, é cada vez mais evidente de que as respostas descentralizadas podem ou devem ter um papel especial que não podemos menosprezar ou ignorar.
E assim, sem prejuízo das boas práticas de planeamento a nível nacional, já não haverá grandes dúvidas do papel que está reservado ao poder e às autoridades locais na concretização destas mudanças de paradigmas. É certo que algumas iniciativas estão já a acontecer e que o tema, de algum modo, começa a estar em cima da mesa, mas não tenham dúvidas: a coisa só lá vai quando houver a coragem, e porventura as condições, para uma mudança de largo espectro, radical mesmo.