As vítimas de assédio sexual protagonizado por professores universitários sofrem consequências de vária ordem. Entre as menos faladas em Portugal estão os impactos ao nível cognitivo. Pode parecer caricato falar do tema sob esta perspetiva, mas escapar a uma abordagem física mais arrojada ou recusar um convite/proposta não é algo que se dilua rapidamente quando há uma relação de dependência, de natureza académica ou laboral.
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O caso dos eventos no Centro de Estudos Sociais (CES) de Coimbra, revelado em livro escrito por antigas alunas e ex-investigadoras da instituição, segue-se ao escândalo, há um ano, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Aliás, as várias faculdades do nosso tecido académico foram então incentivadas a organizar canais de denúncia, mas o assunto morreu, até ontem, dia em que o CES de Coimbra foi notícia pelas piores razões.
Os visados têm direito à presunção de inocência. Isso está fora de causa, mas a questão do assédio cala mais fundo no que diz respeito à evolução académica e profissional das mulheres. E o que pode acontecer a uma vítima de assédio sexual? O assunto é levado muito a sério em países como os EUA e Inglaterra, entre muitos outros. Recomendo a leitura de um relatório de especialistas norte-americanos publicado em 2018 com o título "Assédio Sexual de Mulheres: ambiente, cultura e consequências nas Ciências, Engenharia e Medicina". As vítimas sentem problemas no recrutamento e na progressão da carreira. No ano passado, um estudo inglês, com o título "Enfrentando a má conduta sexual em universidades e faculdades", relata problemas de saúde mental entre as estudantes assediadas. A falta de confiança é inevitável. A mulher vitimada até pode completar o seu percurso académico, mas parte diminuída para uma vida profissional que, em muitos casos, já seria difícil e iníqua. A academia portuguesa precisa de ser investigada por uma comissão independente, à semelhança do que sucedeu com a Igreja.
*Editor-executivo-adjunto