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Ontem, saí para a rua à espera de ver alguma gente com o transístor no ouvido ou, pelo menos, com os auscultadores a balançar nas orelhas, mas foi uma desilusão. Depois do debate da semana passada, "coreanamente" transmitido por três canais de televisão em sinal aberto, era difícil que o debate desta semana, transmitido em rádio, às 10 da manhã, tivesse o caráter decisivo desse primeiro confronto entre António Costa e Passos Coelho.
Não tinha, mas não deixava de ser um momento político importante, especialmente para Passos Coelho, que não poderia deixar que se colasse a si a imagem de um perdedor. E o líder do PSD conseguiu-o, aproveitando os erros do adversário e remetendo-o para onde sempre quis que ele estivesse, a defender o programa do PS.
De fora, ficou Sócrates, por manifesta exaustão argumentativa e o passado, em geral, esteve menos presente, num debate que acabou por ser bastante mais risco de conteúdo. Foi no futuro que o líder do PSD acabou por ganhar, ao levar Costa para um local onde ele já não tinha estado muito confortável no primeiro confronto, na questão das pensões.
Sem se enredar em plafonamento vertical ou horizontal, Passos conseguiu que Costa revelasse toda a dificuldade em explicar onde iria poupar mil milhões de euros em pensões, neutralizando, de alguma forma, as críticas que os socialistas vinham fazendo ao previsto corte de 600 milhões por parte da coligação.
Passos foi ainda mais longe e jogou novamente a cartada de um possível acordo para um tema que todos já perceberam que é complicado para ambos os candidatos a primeiro-ministro e, como não sublinhá-lo, para o futuro dos portugueses. Costa afastou este cenário e politicamente não poderia fazê-lo de outra forma. Aceitar esse diálogo era permitir que os portugueses olhassem mais para as semelhanças entre ambos do que para as diferenças e o que os socialistas menos precisam é que os portugueses digam "eles são todos iguais" ou que se conformem com a terrível TINA (em inglês, "there is no alternative", ou, em bom português, "não há alternativa").
Nos debates, pudemos ver estilos diferentes e marcar alguns contrastes entre uma coligação que pretende uma evolução na continuidade e um PS que quer evoluir ousando. A disputa até nos ajudou a esquecer, olhando as sondagens, que no dia 5 de outubro não deverá haver um vencedor que possa assumir sozinho a governação e que, como tal, a hipótese de diálogo regressará incontornável.
*SUBDIRETOR