Detesto andar de táxi. O barulho seco e metálico do taxímetro mexe-me com os nervos. Não foi sempre assim. A coisa assumiu as proporções de fobia numa manhã de verão, em Paris, há uns 20 anos, quando ainda era preciso passaporte para circular na UE, o multibanco era um luxo e o telemóvel não andava no bolso, mas arrumava-se na mala dos carros. Foi uma viagem de ir num dia e vir noutro, a convite da Peugeot/Citroën, para nos mostrar umas inovações à Júlio Verne.Ao fim da tarde, já instalado no hotel, como não era da tribo (a dos jornalistas de automóveis), declinei o convite para jantar e prometi que no dia seguinte às oito horas estaria no átrio, pronto para partir para o lugar da demonstração, um autódromo nos arredores. Meti-me no metro até ao Boul Mich onde vi que era a noite da Festa da Música. Havia sempre alguém a cantar ou tocar nos cafés, bares e esquinas.
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Deitei-me muito tarde. Pedi o despertar para as sete, mas ou o telefone não tocou ou eu não ouvi. Fiquei em pânico quando acordei e vi que eram quase dez. Tinha o bilhete de avião, mas horrorizava-me a perspetiva de só voltar a reunir-me com o grupo em Orly, para a viagem de regresso. Desatei a fazer telefonemas até descobrir qual era o autódromo. Desesperei até arranjar um táxi. Quando começava a acalmar, reparei que não tinha francos que chegassem para pagar a corrida.
No autódromo, morto de vergonha, expliquei ao taxista que não tinha dinheiro, pedi-lhe que esperasse e perante os olhares reprovadores de colegas e anfitriões interrompi a reunião, para pedir 300 francos emprestados.
Fiquei com fobia aos táxis, mas nada me move contra os taxistas, que estão agora a ser inundados pelo tsunami tecnológico que varre a sociedade. Surfando a onda digital, uma startup californiana lançou a Uber, uma app que faz o encontro entre oferta e procura de serviços urbanos de transporte.
A oferta varia do luxo até ao low cost (uberx), passando por taxistas licenciados e SUV para seis pessoas. Do lado da procura estão clientes registados, que dizem para onde vão, a viatura que querem - e ficam logo a saber o tempo de demora e o preço da viagem, que lhes é descontado no cartão de crédito.
O desembarque da Uber na Europa está a ser recebido com indignação por motoristas de praça credenciados e empresas de táxis com alvará, que protestam na vã esperança de convencer os governos a ilegalizarem a nova concorrência. Compreendo a reação corporativa. Mas se fosse a eles não me iludia. A Internet está a mudar radicalmente as nossas vidas e não é inteligente ignorar os novos desafios.
O caminho certo não é tentar deter um tsunami com um dique de leis e proibições. A solução está sempre em adaptarem-se ao alargamento da oferta, melhorando e sofisticando o serviço, ajustando o preço à nova realidade. Os taxistas têm de aprender com as experiências recentes. Não foi com providências cautelares e apelos à proibição que a CP e a Renex responderam à oferta da Ryanair de voos Porto-Lisboa a dez euros e ao florescimento de grupos de partilha de boleias no Facebook.