Corpo do artigo
Os seguidores das histórias do Tintin hão de lembrar-se das personagens Dupond e Dupont. Quase gémeos (exceto no bigode), palavrosos e irrelevantes, assemelham-se bastante aos programas eleitorais da AD e do PS para as áreas da Ciência e do Ensino Superior: quando a AD afirma que “a Ciência e a Educação Superior são dois eixos fundamentais para a transformação da nossa economia e para garantir mais bem-estar à nossa sociedade”, quase se pode ouvir o PS a interromper com o emblemático “eu diria mesmo mais”, antes de considerar que “o Ensino Superior e a Ciência têm sido pilares essenciais da qualificação dos portugueses, do desenvolvimento e da modernização da economia e da sociedade”.
Todavia, se se excetuarem as afirmações vagas e as promessas mil vezes repetidas (como “aproximar” ou “atingir”, até 2030, os 3% do PIB em investimento em ciência e inovação), os programas dos dois partidos do chamado “arco do poder” em Portugal revelam uma preocupante falta de ambição estratégica e continuam a descurar a importância do Ensino Superior, e da Educação em geral, para a definição do futuro que teremos.
Num país ocidental e de matriz social-democrata, o sistema de ensino existe para permitir que todos desenvolvam o seu potencial, independentemente da área a que se queiram dedicar. Este desígnio deve ser assumido desde as idades mais precoces, de modo a encaminhar os jovens para um percurso escolar que possibilite o seu crescimento e o acesso ao elevador social que só a educação proporciona. Mas não há, naqueles dois programas eleitorais, qualquer vislumbre de uma política integrada e transversal que altere o atual panorama de desperdício de talento e das capacidades dos jovens portugueses, metade dos quais desiste da sua formação antes de chegar ao Ensino Superior.
Não basta, pois, garantir apoios sociais ou prometer “rever” ou “valorizar” os diferentes estatutos das carreiras docentes. É necessária uma visão clara para o país que queremos construir e ser, e sobre o modo de operar a necessária transformação. A indefinição neste caminho não augura, porém, nada de bom.