A pergunta que se coloca a muita gente é se a classe política que nos trouxe até aqui conseguirá encontrar uma solução para o país. Só nos resta esperar que sim, porque o contrário disso seria a negação da própria Democracia.
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O congresso do PS e as respostas que gerou da Oposição deram-nos um primeiro sinal do que vai ser a campanha eleitoral: acusação atrás de acusação, uma procura incansável e certamente interminável do culpado pelo estado a que chegámos. Antes disso, porém, vai ser necessário negociar o empréstimo com os parceiros europeus e vamos ver quem e como está disposto a acatar medidas bem mais pesadas do que as integravam o chumbado PEC IV. É possível que os dirigentes políticos tenham uma noção do desencanto e do cansaço que a sua actuação causa ao país. É possível que já tenham olhado para os últimos resultados eleitorais e analisado a crescente abstenção e o número elevado de votos brancos e nulos. Com a chegada do FMI e o agravamento da austeridade, a condescendência ficará mais curta. De há muito que os principais actores políticos, apesar da crise, agem sem saber avaliar o mal menor e a sua intransigência trouxe-nos até aqui.
Sócrates e o PS, além dos erros que cometeram, agiram em minoria como se tivessem maioria e agiram perante o presidente da República com o mesmo desdém que este lhes dedicou no discurso de posse. Há muita gente no PSD que pensa que Sócrates escolheu o timing da sua própria queda, esticando a corda, sabendo que ela partiria. O facto é que, em nome dos bons princípios, Sócrates deveria ter-se reunido com Passos antes de apresentar o PEC IV e deveria ter dado conhecimento do que pretendia ao presidente. Estaria hoje mais confortável na razão que lhe assistisse.
O PSD vai ter em breve de explicar porque recusou o PEC IV, em nome dos sacrifícios que os portugueses já suportavam, tendo agora de aprovar pacotes bem mais pesados. Vai ter, finalmente, de apresentar as suas propostas, e vai ter, queira ou não, ganhe as eleições ou fique em segundo lugar, de negociar com Sócrates. Um mal menor teria sido certamente aprovar o PEC IV e exigir eleições de imediato. Mas o PSD também teve o seu momento de arrogância, ao vergar Sócrates e ao clamar que o rating da República não cairia. Viu-se.
O CDS percorreu caminhos idênticos aos do PSD, mas com menor responsabilidade, dado o seu peso eleitoral. Terá agora também de explicar porque contribuiu com o seu voto para a queda do Governo, mas também é um facto que Portas tem há muito prontas as suas propostas e o seu silêncio revela que não quer estragar o seu papel no futuro próximo.
Os dois partidos à esquerda do PS já deram um passo de elevado significado, ao reunir-se um com o outro: estudam como pode a Esquerda posicionar-se, como podem as suas propostas constituir-se como válidas. O encontro terá significado para ambos os líderes - mais para Jerónimo, certamente - o deglutir de um enorme sapo, mas teve a virtude de os retirar da ineficácia da sua actuação. Mas não haja ilusões, foi, por agora, um curto interregno.
Também a CGTP tem desconhecido a teoria do mal menor. A sua presença na Concertação Social não tem resultados visíveis, mas o que aí vem será bem pior do que aquilo que a CGTP tem recusado. Claro que há questões que a CGTP tentará resolver na rua, mas isso só fará sentido se a compreensão de que a austeridade é necessária não for esvaziando a disponibilidade dos que se têm manifestado.
Resta Cavaco Silva, possivelmente o que mais bem deveria conhecer o peso do mal menor, mas que não exerceu qualquer magistério de influência que pudesse ter contribuído para a aproximação entre os partidos. Fez um discurso de posse duro, tardio e ineficaz. Assistiu ao desenvolvimento da crise com a impotência de vulgar cidadão, e, agora, dá de si a imagem de quem pouco pode fazer na negociação com Bruxelas.
O país precisa de consensos. E precisa de mudar o rumo. Nada disso se conseguirá se não mudarmos atitudes. E a pergunta que certamente se coloca a muita gente é se a classe política que nos trouxe até aqui conseguirá encontrar uma solução para o país. Só nos resta esperar que sim, porque o contrário disso seria a negação da própria Democracia. Mas isso significa que, antes de voltarem a fazer política, os políticos estabeleçam plataformas que apontem para o desenvolvimento sustentado do país e nos retirem do círculo vicioso da crise. Que sejam capazes de substituir meias-verdades e mentiras por discursos realistas que implicarão, certamente, vivermos uns patamares abaixo do que vivemos hoje, mas vivermos em total independência política e económica.