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A bandeira verde e vermelha tinha acabado de subir no poste em frente ao imponente edifício da câmara de Boston enquanto uma emigrante entoava o hino de Portugal e dos Estados Unidos, acompanhada pela Filarmónica Santo António de Cambridge. Seguiu-se o rancho folclórico Corações Lusíadas com o seu pezinho de dança ao som do vira.
Para completar o quadro do simbólico nacional, ao meu lado um emigrante envergava a camisola da seleção de futebol e foi com ele que meti conversa para perguntar como seguia a comunidade emigrante as andanças da equipa nacional. E mal a conversa tinha começado, os olhos dele encheram-se de lágrimas.
Não fossem aquelas lágrimas espontâneas e provavelmente tinha-me ficado pelo quadro típico da emigração portuguesa. Mas as lágrimas de Fernando Rodrigues, 48 anos de idade, 41 de emigrante, eram a prova viva de que há emoções e valores que merecem mais do que um julgamento apressado, que merecem o nosso respeito.
Isto vale para a seleção de futebol, que enjoamos de ver em anúncios e em repetitivos debates, mas que não nos podem fazer esquecer que, independentemente dos resultados, aqueles jogadores e o equipamento que envergam são um íman único, com o poder para juntar num mesmo momento os milhões de portugueses que povoam o Planeta.
Isto vale para a TAP - a razão da minha viagem a Boston - que, para lá dos titulares do seu capital social, continua a ser para aqueles emigrantes a companhia área portuguesa e aquela em que eles preferem viajar porque de alguma forma ao entrarem num dos seus aviões já estão a chegar mais cedo a casa. Como valerá para um punhado de outras coisas, como os canais nacionais de televisão ou... a CGD.
Num altura em que com facilidade vemos diluírem-se as fronteiras em que tudo o que é financeiro, em que a nossa banca privada já é quase toda espanhola ou angolana, torna-se estratégico lutar pela manutenção de um banco nacional, ainda mais um que é de todos nós. Por isso, estranha-se a ligeireza com que, num momento delicado se propõem comissões de inquérito que podem ter um efeito destrutivo e pouco clarificador. Sim, é preciso separar cada vez mais a política dos negócios, mas façam-no com regras para o futuro em vez de chafurdar na lama do passado para a qual todos os partidos que governaram contribuíram.
Numa época em que relativizamos tudo, é importante preservar algumas coisas do jogo do momento. Se não for por respeito a nós próprios, que seja por respeito às lágrimas dos emigrantes.
* SUBDIRETOR