Boas pessoas mas sem literacia
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Nestes dias, ficámos a saber algo que suspeitávamos - a população portuguesa é, dentro da Europa, daquelas que apresentam maiores défices de literacia financeira.
Esta realidade mostra-nos que, ao olharmos para as necessidades de financiamento das famílias e empresas portuguesas, para as lacunas no nível de poupança nacional, assim como na exposição de muitos agentes económicos portugueses aos solavancos da Euribor, uma realidade mais densa se impõe.
Antigamente, não era impossível mas decerto não era também muito comum que os agregados de pessoas analfabetas tivessem ou comprassem muitos livros. Poderiam tê-los por herança, por achamento ou por doação, mas o fenómeno não era comum. No entanto, hoje, muitos destes portugueses sem literacia financeira suficiente estão expostos à boa-vontade dos funcionários das agências bancárias, aos algoritmos internos de nivelação do acesso ao crédito ou ao ambiente mais ou menos instruído e mais ou menos prudente em redor. Porque, na realidade, não sabendo o que assinam, em muitos casos assinam de cruz. Endividam-se e ficam mal servidos.
Este facto obriga a uma exigência ética e deontológica de todos os profissionais que trabalham na concessão de crédito - desde os que fomentam os programas de microcrédito até ao crédito ao investimento privado ou ao investimento de estruturas públicas. Na realidade, a iliteracia financeira não fica atenuada se, ao aumentar o grupo exposto, não conseguir que dentro deste grupo haja mais gente informada, avisada ou prudente.
Como nos Princípios de Condorcet, a regra da maioria como decisora adequada só funciona se a tendência individual para acertar ou escolher coisas boas for maior do que a probabilidade em escolher mal. No fundo, se todos aqueles que procuram, decidem, pressionam e concedem créditos e financiamentos tenderem a ajuizar bem e não a responderem a impulsos, então aí tenderemos a perceber um pouco mais do nosso dinheiro e do dinheiro que pedimos aos outros.