Nunca como agora terá estado o povo mais humilde tão atafulhado de problemas. O desemprego alastra, o crédito malparado sobe em flecha, a crise económica desestrutura famílias e gera cada vez mais novos pobres, carecidos de quem lhes mate a fome e faculte um mínimo de dignidade. Num cenário assim, dramático mas real, só a resposta pela dádiva e a partilha da sociedade permite atenuar sofrimentos.
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Da teoria à prática, a que se assistiu sábado e domingo?
Os saquinhos distribuídos por 38 mil voluntários do Banco Alimentar encheram-se pela doação de bens de primeira necessidade, destinados a ajudar 1800 instituições de solidariedade social a minorar as carências dos próximos tempos de mais de 337 mil portugueses. Nos hiper e nos supermercados foi possível assistir a cenas de enorme altruísmo. Grande parte dos portugueses a quem ainda não tocaram os constrangimentos orçamentais deram o seu contributo; e tocante, muito tocante mesmo, foi verificar como pessoas em notórias dificuldades, daquelas que já tem saudades de poder dar aos filhos um bife de carne de vaca ao jantar e não escondem estar a contar todos os cêntimos antes de se dirigirem a uma caixa para pagar, não hesitaram: ofertaram um pacote de leite ou um saquinho de arroz ou de massa. Anónima mas de coração aberto, uma generosidade assim multiplicou-se. Muitos poucos fizeram muito para um auxílio precioso a quem a vida se tornou madrasta.
Em tempo de crise a recolha de bens pelo Banco Alimentar teve, pois, um notável contributo dos cidadãos. Ficou mais uma vez provado estarem os portugueses prontos a ajudar o próximo se e quando acreditam nas instituições - e o Banco Alimentar liderado por Isabel Jonet é respeitado, não está no olho do furacão das permanentes suspeitas.
A dádiva é tanto mais assinalável quanto as visões austeras e geradoras de pobreza parecem não ter fim, em Portugal e numa grande parte da Europa. A solidariedade como virtude da cidadania precisa de ser duradoura. Quando a diretora geral do FMI, a francesa Christine Lagarde, mostra os dentes e aconselha os gregos a pagarem impostos com o dinheiro que não têm, considerando-os privilegiados face à miséria do Níger, o melhor é ficarmos de atalaia. É que não consta que a senhora posta à frente do FMI pelos interesses norte-americanos esteja a preparar um leilão das suas malas Louis Vuitton (mais de 30 mil euros) para ajudar a matar a fome no Níger, no Sudão ou no Mali.