Não são as dúvidas sobre o que vai dizer Bruxelas. Ou Bruxelas dizer. O discurso será apaziguador. Nem as indicações sobre os eventuais planos B que o primeiro-ministro sacode com insistência, porque austeridade é palavra proibida no léxico deste Governo. O que realmente importa ler no Programa de Estabilidade é a evolução do cenário macroeconómico. O documento é um plano de futuro para António Costa.
A dureza das metas previstas e da contenção na despesa pública vai doer na segunda metade da legislatura. Se a isso se somar o irrealismo das previsões de crescimento, a execução orçamental vai ser particularmente exigente a cada ano que passa. António Costa está a preparar-se para ir novamente a jogo antes que a bomba-relógio lhe rebente nas mãos.
No Parlamento, o PSD prescindiu de pedir a votação dos documentos estratégicos aprovados esta semana em Conselho de Ministros porque teria dificuldade em justificar um voto negativo. O exercício do Programa de Estabilidade mostra total comprometimento com as metas europeias. Conta com o apoio do presidente da República. E passa sem ruído junto dos partidos de Esquerda, que darão sinais de vida lá para setembro, quando se começar a preparar o Orçamento do Estado para 2017.
Confrontados à nascença com a premonição de que o acordo teria vida curta, os partidos de Esquerda sabem que é demasiado cedo para a bomba rebentar. A devolução de rendimentos tem-se mantido como dogma intocável, para assegurar a declaração de óbito à austeridade. Mais cedência, menos cedência - e no programa há algumas caras ao Bloco de Esquerda, como o agravamento da tributação do imobiliário para quem detém mais propriedades -, é de esperar que o Orçamento venha a ser conseguido sem sobressaltos.
O rastilho, no entanto, vai continuando a arder. A fragilidade da economia mundial. O crescimento a ser permanentemente revisto em baixa. A Banca em infindável crise, ameaçando continuar a consumir mais dinheiro público. Tudo contribui para um cenário explosivo. O otimismo é o melhor remédio que o primeiro-ministro tem para tranquilizar o país e a Europa, mas não cura todos os males. Enquanto estiver a subir nas sondagens, terá que capitalizar todas as medidas simpáticas já decididas. E estar preparado para provocar eleições.
A bomba está a fazer tiquetaque.
