No diálogo que fundamenta a nossa condição de humanos esquecemos demasiadas vezes os exemplos, ainda que raros, que contradizem o fatalismo das generalizações.
O vento passa, nas palavras do poeta. "Mas há sempre uma candeia / Dentro da própria / desgraça / Há sempre alguém que semeia / Canções no vento que passa."
Rui Nabeiro foi um semeador de canções num país tantas vezes descrente na sua capacidade de ultrapassar problemas, de combater a injustiça e a pobreza, de se fazer grande, imenso.
Felizmente soubemos reconhecer nas últimas décadas a importância de Rui Nabeiro, o seu exemplo conciliador, a sua capacidade de concretizar sonhos e de unir sucesso empresarial e bondade. Bondade e não apenas "responsabilidade social" porque Rui Nabeiro foi, acima de tudo, um homem bom.
Em tempos tensos e difíceis, como os que vivemos, há uma tendência para generalizações. Generalizações que agravam as divisões e dificultam o encontro de vontades essencial à resolução dos problemas.
No meio das crises, pessoas como Rui Nabeiro souberam sempre encontrar a palavra de esperança, de sabedoria, que nos fazia parar para pensar. E precisamos muito destas vozes sábias, humanistas, que acreditam na força do país e dos portugueses e são capazes de nos mobilizarem para os desafios.
Vozes que transparecem bondade e crença. Vozes com a autoridade moral que só existe pelo exemplo que dão, pela sua vida, pelo seu comportamento ético, pela sua preocupação com os mais frágeis, pela sua capacidade de nos indicar caminhos.
E os caminhos, por difíceis que pareçam, só se constroem pelo diálogo, pela empatia, pela determinação de não esquecer onde queremos chegar.
Por isso reconheço a determinação com que a ministra Ana Mendes Godinho anunciou que, apesar dos apelos contrários, Portugal continuará a apoiar as pessoas, as famílias e as empresas neste momento difícil. Esse é o maior tributo que podemos prestar aos humanistas como Rui Nabeiro: o de sabermos construir um país solidário em que ter sucesso nos negócios não implica explorar as pessoas, em que os interesses legítimos de cada um de nós não provocam prejuízo aos restantes, em que a bondade pode ser chamada à ação política como elemento estruturante.
É difícil? Sem dúvida. Mas também foi muito difícil, a partir de Campo Maior, num Alentejo que era pobre e esquecido, fazer a obra que Rui Nabeiro sonhou e concretizou.
Aos 91 anos, Rui Nabeiro despede-se de nós, mas deixa-nos na tristeza de o perdermos um exemplo que nos engrandece a todos. Obrigada, Senhor Comendador!
Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses
