Dezasseis personalidades (gosto particularmente da palavra "personalidades", porque não significa coisa nenhuma e um significante sem significado nem referente é sempre uma aventura da linguagem) das mais dispersas áreas - jornalistas, políticos, empresários, sindicalistas, polícias, militares, mais o inevitável bastonário dos advogados - confessaram-se ao DN receosos de serem alvo de escutas, pelo que "quando falam ao telefone, têm cuidado" (imagino que evitando dizer palavrões, pois podem estar a ser escutados por uma senhora).
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Uns ouvem "ruídos estranhos", outros "pequenos sons" e "sinais", outros têm "a conversa subitamente interrompida" e outros só já falam abertamente ao telefone quando falam "de vinhos".
Invejo esta gente, que deve ter uma vida animadíssima, cheia de existências paralelas, segredos, conspirações ou tão-só "assuntos relevantes" como António Capucho, ex-membro do Conselho de Estado (ser ex-qualquer coisa é uma das profissões portuguesas mais prestigiadas, uma espécie de profissão de fé). Pobre de mim, que sou mais do género Álvaro de Campos, "um diálogo contínuo, /um falar-alto incompreensível" e não tenho nada de interessante ou promíscuo que dizer ao telefone.
Compreende-se finalmente o aparecimento diário de tantas ninhadas de romancistas: são os escutadores do SIS e do SIED, pode faltar-lhes talento mas experiência de vida, alheia que seja, decerto não lhes falta.