A proposta de redução do valor das propinas pagas pelos alunos do Ensino Superior merece uma reflexão cuidada, face à importância que este setor tem na formação dos futuros responsáveis pelos destinos do país. A ação do Estado, na sua relação com os estudantes, deve orientar-se, predominantemente, no sentido de garantir a existência de um sistema de que permita o acesso ao Ensino Superior e a sua frequência a todos os estudantes. Teoricamente, a ação social garante que nenhum estudante será excluído do subsistema do Ensino Superior por incapacidade financeira, promovendo, assim, o direito à igualdade de oportunidades de acesso, frequência e sucesso escolar.
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Se recuarmos um pouco na análise história, vemos que até à revolução de Abril de 1974, o acesso ao ensino foi, nos princípios, sempre livre e universal, podendo dizer-se que ninguém ficou privado de estudar por falta de oferta. As universidades tinham uma capacidade formatada pela expectativa de uma baixa procura, isto é, embora o ensino não excluísse ninguém, a sociedade não interiorizara, minimamente, a educação como um direito "natural", encarando-a, antes, como um privilégio a que acederiam os "bem-nascidos" e aqueles poucos que, por capacidades excecionais, emergissem até às camadas superiores. Pode dizer-se que o sistema de ensino podia ser inclusivo, porque a sociedade encarregava-se de excluir as pessoas do sistema. Por outro lado, vemos que a atual oferta formativa é pulverizada, por vezes excessiva, não raras vezes redundante.
Em termos de financiamento, a sociedade portuguesa tem efetuado um esforço muito significativo no Ensino Superior. Não sendo assim justo aumentar a taxa de esforço atual das famílias, já por si muito elevada, parece razoável proceder à sua diminuição. Uma das hipóteses mais interessantes poderia ser um novo enquadramento das deduções fiscais nesta matéria. Mas recuperar, per se, a narrativa ideológica, herdada sem crítica e sem critério, de que o Ensino Superior é "universal e gratuito", poderá reduzir e radicalizar a discussão em demasia no montante das propinas e o orçamento das instituições, com os reitores das universidades e os presidentes dos institutos a queixarem-se, naturalmente, de que não têm dinheiro sequer para os salários.
* PROFESSOR CATEDRÁTICO, VICE-REITOR DA UTAD