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Se alguém gastar mais do que o que ganha pode diminuir as despesas ou aumentar os ganhos ou conseguir as duas coisas ao mesmo tempo. Se nenhuma destas hipóteses for viável, tem de conseguir alguém que lhe empreste dinheiro ou lhe venda a crédito. Fie, dizia-se. Quando se começa a desconfiar, corta-se no que se vende fiado ou faz-se o comprador pagar mais caro o que se vende. No limite, se ninguém lhe fiar, por não se fiar em si, então terá mesmo de apertar o cinto. Simples! Se, por azar, tudo isto acontece quando as circunstâncias da vida exigiriam que gastássemos mais, para acorrer a uma doença de que fomos acometidos, é um drama.
Esta que poderia ser a sina de uma família é, mais coisa menos coisa, a do nosso país. Andámos a gastar mais do que podíamos e devíamos. E, logo agora que a crise económica nos bateu à porta, e precisamos de gastar mais é que (as agências de "rating" e organismos internacionais) começam a desconfiar (mais) de nós.
Os remédios são também semelhantes: gastar menos ou, pelo menos, não gastar mais. Aumentar os rendimentos. E, especialmente, manter ou recuperar a credibilidade junto dos credores internacionais o que, em regra, passa por sinalizarmos o nosso empenho em gastar menos ou obter mais receitas...
Coloque-se, agora, na pele de alguém que avalia a República Portuguesa. O Governo diz-lhe que vai endireitar as contas até 2013 mas, para calar os professores do secundário, encontra uma solução que lhe vai custar mais uns largos milhões quando todos os professores chegarem ao topo da carreira e desata a criar estágios na mesma Função Pública que diz ir emagrecer. A Oposição, desde a que podia ser alternativa de governo até à que quer uma alternativa para o sistema, encontra no corte de receitas e aumento de despesas uma base de consenso. E o presidente da República assiste a tudo quedo e mudo.
Emprestava-nos dinheiro? Talvez sim, mas mais caro. Se o desvario persistir, e as probabilidades de incumprimento aumentarem, o custo será progressivamente maior. Para todos, Estado, bancos, empresas, particulares. O que, paradoxalmente, condicionará a viabilidade de muitos negócios e se poderá tornar numa profecia que se autoconfirma: o país não será capaz de gerar uma dinâmica que o tire do buraco em que se meteu.
Há saída? Há! Envolve a elaboração de um plano estratégico para a economia portuguesa que reúna, quanto às suas linhas essenciais, o consenso político entre o PS, o PSD e o presidente e o apoio dos principais agentes económicos e sociais. Um plano de verdade que defina com clareza qual a dívida pública, directa e indirecta, e que assegure que não haverá artifícios contabilísticos para colocar as finanças no são. 2013? Um prazo demasiado curto, impossível de cumprir: a economia não crescerá o suficiente para gerar receita e aliviar as despesas sociais. 2013, um prazo que será certamente negociável se houver o consenso político que referi.
Miguel Cadilhe propôs algo semelhante há seis anos. Eduardo Catroga tem-no vindo a fazer, recentemente. A mim, parece-me uma ideia que vale a pena discutir. Depressa. Antes que a conjuntura política crie factos consumados que retire ao país toda e qualquer credibilidade. A solução pode ser dura, exigir sacrifícios, mas será uma brincadeira de crianças comparada com o que nos acontecerá se não agirmos.