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Cerca de 200 personalidades, do mundo do espectáculo ao da política, subscreveram o manifesto em que apelam a uma profunda reforma da Justiça. Estão no seu direito, desde que não ofendam os direitos dos outros. Exigir-se-ia mais rigor e clarificação nas causas e razões da sua pretensão, mas é a liberdade de expressão. Por isso que, também aos magistrados, nomeadamente aos do MP, assiste o direito, e até o dever de publicamente se manifestarem, contrapondo a sua visão e a sua interpretação dos acontecimentos judiciários, como que num direito de resposta. Mas, os magistrados pecam, em minha opinião, quando percepcionam uma campanha orquestrada contra si e o exercício das suas funções na área da investigação criminal. Para mim, não existe tal campanha, mas sim, uma cacofonia de vozes isoladas e exaltadas, que se juntam, por coincidência e conveniência pontual, num vórtice de aparentes verdades, erros grosseiros, mesmo, numa tentativa de condicionar e restringir a actuação do MP nas investigações do crime económico-financeiro. Chamar de “essa corja” aos magistrados, apelidando-os de incompetentes e agindo sem qualquer controlo é injurioso e inverdadeiro; subestimar e rebaixar o cargo de PGR, topo da hierarquia de uma magistratura que corporiza um órgão autónomo de justiça, sugerindo que o/a futuro/a indigitado/a passe a ser inquirido/a na AR, previamente à sua nomeação, é ousadia e desconhecimento da CRP. Sem menosprezo por aqueles que ocupam lugares nos topos de instituições públicas, cuja orgânica impõe a audição prévia à sua nomeação na AR, não é uma campanha orquestrada, mas sim, um vicio de interpretação da lei constitucional. Esta integra o MP no órgão de soberania tribunais. O/a PGR é indigitado/a pelo Governo e nomeado/a e empossado/a pelo PR. A democracia de direito pressupõe solidariedade e cooperação entre os vários órgãos de soberania e as diversas instituições do Estado. Não é natural, nem aconselhável, que representantes daqueles órgãos e instituições venham publicamente criticar e propor, fora do lugar próprio, alterações profundas à nomeação e responsabilidade dos outros representantes do Estado, que não fazem parte da organização político-partidária. Não é campanha orquestrada apoucar publicamente, através dos media, a pessoa e a actuação da PGR, mas é difamatório! Pode, naturalmente, discordar-se da sua postura, do seu modo de (não) actuar, mas quando o/a autor/a das críticas negativas são altos funcionários do Estado, a linguagem tem de ser contida e adequada à dignidade das funções que cada um exerce ao serviço da democracia. Por isso que a campanha em desenvolvimento é absolutamente desordenada, insólita e subliminar. Porém, ao contrário do que se pensa, o povo entende e julga os objectivos de todos os intervenientes nesta saga. Reforma da Justiça, sim, mas que ressalve e resguarde a autonomia do MP e os meios de investigação criminal.