Corpo do artigo
“A família foi criticada ideologicamente por ser uma célula pequeno-burguesa, mas é o único espaço onde o capitalismo não conseguiu penetrar. Não se trata do casal, que é uma pequena empresa de cuidados mútuos. Se existe amor incondicional, esse é o dos pais pelos filhos. Aí não há qualquer relação mercantil, não se pode colocar um preço. É o grande mistério, o mais belo da vida”.
A ideia contida naquela citação pertence a Manuel Vilas, escritor espanhol, tendo sido proferida no contexto de uma entrevista ao “El País”, em 2019. Esta abordagem é particularmente relevante quando pretendemos abordar o livro “Identidade e família”. Esqueçamos a apresentação pública da obra, protagonizada por Pedro Passos Coelho. Talvez seja bem mais útil olhar para o conteúdo, sem preconceitos. Dizer mal de algo que nem lemos é um exercício fútil. Dizer bem sem ter olhado para o livro é desonesto.
Retenho uma das ideias do livro que merecem algum debate. As famílias são descritas como pilares essenciais da sociedade. A sugestão de lhes conceder o estatuto de parceiro social, assim como a possibilidade de um “salário” para o pai ou para a mãe que se dedique exclusivamente ao seu núcleo, reforçaria a sua importância no tecido social. A solução permitiria também que os idosos recebessem o cuidado e a companhia dos filhos, pondo-se de parte os lares como a solução quando falta espaço físico e dinheiro. As propostas, se implementadas, desonerariam o Estado de certas obrigações.
As boas ideias são sempre bem-vindas, embora nada garanta que a família tradicional seja desse modo defendida. Porquê? As políticas familiares na Suécia, muito impulsionadas pelos sociais-democratas, não impediram as altas taxas de divórcio e de famílias monoparentais lideradas por mulheres, sendo que o matrimónio está há muito em queda. O Mundo mudou. Isso é certo.