Na primeira quinzena de dezembro, a UNESCO vai consagrar os "caretos" de Podence como Património Mundial, ao inscrevê-los na lista do Património Cultural Imaterial da Humanidade, após a recomendação já aprovada pelos seus peritos.
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A candidatura, designada "Festas de Inverno Carnaval de Podence", é a única apresentada pelo Governo português, que, durante meses, reuniu e avaliou pareceres de especialistas e documentação credível para poder arriscar os seus créditos em desafio tão ousado.
Muitos ainda encaram as manifestações dos "caretos" de Podence como meros divertimentos de festas de rapazes rurais, propícios, pela iconicidade dos trajes e exotismo corporal, a interessantes registos em fotos e vídeos. E pouco mais. Folguedos passageiros, dirão. Chegou, porém, a hora de levar mais a sério estas manifestações. Se o Mundo vai render-se a elas, saber-se-á então porquê.
A sua origem tem milhares de anos. Mantendo grande coerência com os referentes ancestrais, os "caretos" personificam, na sua expressão icónica, os seres sobrenaturais herdeiros dos deuses diabólicos das festas Lupercais romanas. Corpo peludo, máscaras demoníacas, chicoteando e perseguindo mulheres, ritos de fertilidade nos gestos eróticos, sugerem essa herança, para além de o singular "entrudo" que ativam recuperar as primitivas festas do ciclo de inverno, repondo as conceções cíclicas do tempo, que tomavam como base o ano solar e a sua estacionalidade. Daí que seja também o tempo propício para que as pequenas comunidades transmontanas levem a cabo uma espécie de catarse festiva para reorganizar o seu microcosmos sociocultural em preparação da chegada de um tempo novo, mais esperançoso, o tempo de um novo ciclo produtivo.
*Escritor e jornalista