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A história aconteceu há quase meio século. Um grupo de miúdos, talentosos e idealistas, juntara-se para formar uma banda. Logo após o 25 de Abril, o espaço estava ocupado pelos cantores que regressaram do exílio e pelos que, tendo ficado, eram reconhecidamente da oposição ao regime. Havia também outros projetos a nascer e os tais miúdos cedo revelaram potencial. Deram ao projeto o nome Trovante, tornaram-se a banda mais importante da história da música popular portuguesa e celebram no próximo ano, em dois concertos únicos, os 50 anos de carreira.
É possível que recordem a história de há quase meio século. Tinham acabado de lançar o primeiro álbum ou estavam para o fazer, não sei precisar. Poucos os conheciam e não tinham dinheiro para comprar uma aparelhagem para ensaiar e poder tocar em espetáculos feitos em vãos de escada ou no cimo de tratores. Engoliram o orgulho, encheram-se de coragem e pediram ajuda. Represas, Gil e Faria perguntaram a Carlos do Carmo se lhes emprestava dinheiro. E o fadista, para desespero da mulher, assinou-lhes um cheque de 200 contos. Um cheque que foi, ao mesmo tempo, uma responsabilidade. Tinham de trabalhar para devolver a massa, o que fizeram em poucos meses. Maria Judite, quando os miúdos saíram, desabafou: "Carlos, tu és maluco! Nem os conheces bem e dás-lhes esta fortuna para as mãos?". O marido respondeu que lhe bastava ouvir as canções para perceber o material de que eram feitos, que não se preocupasse. Saudades desta gente.