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Caro ministro das Finanças,
A carta que enviou a alguns eurodeputados - não recebi, mas li - afirmando a inconveniência de sanções a Portugal - estamos absolutamente de acordo - foi simpática. Lamentavelmente, antecipa que não faz particular ideia de como as coisas funcionam em Bruxelas.
1. Anote por favor que o presidente da Comissão de Agricultura (AGRI) não se chama Jerzy Buzek. Enganou-se. Também é polaco, é verdade, mas assina Czeslaw SIEKIERSKI. O destinatário nunca rececionou a missiva. E se a tivesse recebido, não teria gostado. Ninguém gosta de ser tratado pelo nome de outra pessoa. A propósito, Jerzy Buzek foi presidente do Parlamento Europeu. Qualquer pesquisa básica na Internet teria evitado o equivoco e o embaraço.
2. O PS nunca ligou particularmente à agricultura. Não vai muito tempo, o ministro Jaime Silva devolvia a Bruxelas milhões de euros em fundos, que teriam sido essenciais ao país. Com o CDS e o PSD no Governo, aconteceu o contrário. Em 2014, Portugal foi um dos primeiros países a ver aprovado o PDR 2020, que garante perto de 600 milhões de euros anuais, decisivos para o setor. A própria PAC representa quase metade do orçamento comunitário. Esquecer os eurodeputados da AGRI, que disporão de tempo próprio e opinião no debate, não foi propriamente avisado. O ministro Capoulas dos Santos certamente lhe explicará porquê.
3. Se realmente está preocupado com a perceção europeia relativamente à credibilidade das finanças públicas nacionais, não entregue a pasta ao BE, nem aplauda de cada vez que o primeiro-ministro citar Karl Marx, para sentir o carinho do Jerónimo de Sousa e da Catarina Martins nos debates parlamentares.
Como calculará, são ainda muitos os eurodeputados que a Leste viveram e guardam memória traumática do jugo soviético. Sentiram a pobreza extrema e experimentaram física e ideologicamente a loucura do domínio comunista. Estão na UE, precisamente porque derrubaram o Muro de Berlim. Acreditam nas virtudes da economia de mercado. E arrepiam-se, assustados, de cada vez que ouvem as proclamações revolucionárias dos novos amigos que suportam o PS na geringonça.
4. Já agora, não trate a Europa por tonta. Os eurodeputados sabem bem que o compromisso de défice inscrito pelo PS no OE para 2016 é de 2,2 % do PIB, que de resto repetiu na defesa enviada em julho à Comissão Europeia, repudiando as sanções. Falar de 2,5% de défice na carta aos eurodeputados não é erro de escrita. É sonsice. E mede-se em centenas de milhões de euros.
Com consideração,
Nuno Melo
* DEPUTADO EUROPEU