Foi uma coincidência engraçada. Há umas semanas vi um documentário sobre uma aldeia italiana curiosíssima, cujas casas, mais de mil, eram pequenos edifícios redondos, coroados por telhados cónicos de pedras montadas.
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O jornalista percorria ruas estreitas e calmas e até visitou uma das casas, onde almoçou com uma simpática família autóctone.
Fixei o nome - Alberobello - e pensei que gostaria de a visitar, original e serena como a vi.
Por estes dias, em que percorro alguns lugares do sul de Itália e Grécia, percebi, com surpresa, que Alberobello ficava a uma hora de viagem de Brindisi, a minha primeira paragem.
Procurei informar-me e a minha curiosidade recrudesceu. Alberobello deriva de "Sylva arboris belli", a selva das árvores de guerra, porque destas florestas Veneza, a Sereníssima República, construiu a sua armada. As extraordinárias pequenas casas, os trulli, têm a sua origem associada a uma engenhosa ideia de ... fuga ao fisco.
Na segunda metade do século XVII, o conde Giangirolamo II terá sugerido aos habitantes que construíssem casas fáceis de desmontar para fugir aos impostos devidos pela construção de casas novas.
No centro de uma extraordinária região oleica, com mais de 60 milhões de oliveiras inventariadas, algumas do tempo dos Romanos e ainda a produzir, a aldeia emerge ao longe empoleirada num maciço branco, de onde se destacam os chapéus dos trulli, marcados por estranhos símbolos que oscilam entre o religioso e o pagão.
Por qualquer razão que não sei precisar, dirigi-me à cidade absolutamente convencida de que visitaria um monumento histórico, habitado e respeitado. Talvez por estar a muitos quilómetros de Roma, Milão, Pisa, Florença ou Veneza, julguei-me protegida dos exércitos de ocupação em que os turistas se transformaram em todas estas cidades.
Enganei-me, naturalmente. A pequena Alberobello é hoje uma autêntica Disneylândia, apinhada de turistas onde as florestas são hoje de selfie sticks, os trulli alojamentos locais ou lojas de souvenirs anódinos, e a pequena Igreja de Santo António, a única igreja trullo do Mundo, já não parece servir para rezar.
Todos os que por lá se encontram parecem personagens do grande bazar de Istambul, comerciando e convocando em todas as línguas da terra.
Devem ter sobrado só dois, dois velhos, um homem e uma mulher, que vi sentados num canto com um ar verdadeiramente espantado neste dia após dia de multidões fosforescentes.
Sorri para dentro da minha ingenuidade (ou ignorância) e tremi, ao de leve, pelo meu Porto sentido.
Yours TRULLI,
Cristina de Azevedo
* ANALISTA FINANCEIRA