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Com uma regularidade preocupante, sucedem-se os estudos evidenciando o aquecimento global da Terra. Estão ultrapassadas as dúvidas sobre se estava, ou não, a acontecer e já não são precisos "cientistas militantes" empenhados em que os dados confessem o que eles querem. Os resultados têm um denominador comum suficiente para preocupar ou assustar. Por mais medidas que venham a ser tomadas, muitas das alterações são já irreversíveis: o clima é um navio demasiado grande para poder ser parado de um momento para o outro. Não obstante, há quem persista na negação e quem privilegie os seus interesses mais imediatos. Quanto aos primeiros há pouco a fazer: ao longo dos tempos, houve sempre quem recusasse os avanços do conhecimento como se, enterrando a cabeça na areia, pudesse contrariar as leis da natureza. São perigosos quando têm poder e, especialmente, se aliados aos grandes interesses que desprezam o futuro e a Humanidade em favor da ganância. Como sempre, há excepções: a cruzada para inscrever as preocupações com o clima na agenda política americana tem sido liderada pelo multimilionário Tom Seyer que se propõe gastar 100 milhões de dólares para o efeito. Só na América! Há, ainda, quem, pressionado por concorrentes não sujeitos a restrições ambientais exigentes, tenha dificuldade em aceitar as consequências em termos de vendas, emprego ou, no limite, de sobrevivência. Mais do que actores, são vítimas da inércia das instituições internacionais.
Quando se discutem as questões do clima e ambiente, é lógico que a sustentabilidade seja "a" preocupação, não numa lógica fundamentalista mas no sentido de conciliar os avanços civilizacionais com a preservação dos equilíbrios ecológicos fundamentais. Embora Portugal seja uma região na qual as consequências das alterações ambientais podem ser significativas, entre nós a discussão tem sido muito pobre cingindo-se, em grande medida, a um pingue-pongue mais ou menos mediático entre os grupos ambientalistas, algumas grandes empresas e um ministério do Ambiente que, frequentemente, não sabe para que lado cair. A invenção do partido "Os Verdes", uma criação do PC para, na altura, branquear as suas posições pouco ecologistas, em nada ajudou. Talvez os resultados de Marinho e Pinto, que catapultaram o MPT para a ribalta política, sejam uma oportunidade para corrigir essa lacuna. É verdade que, se a memória não me falha, nunca ouvi a Marinho e Pinto uma única referência às questões ambientais mas, quem sabe...
Para muitos, entre os quais me incluo, a sustentabilidade é uma questão demasiado séria para podermos correr o risco da condescendência. Mesmo não tendo a certeza de quão gravosas serão as consequências, ou recusando a visão imobilista do extremismo ambientalista, há um dever moral para com as gerações futuras que nos impele à prudência. Algo tem de mudar.
Constato que, muitos dos que subscrevem esta conclusão a recusam liminarmente noutros domínios. A sustentabilidade da Segurança Social é, porventura, o caso mais flagrante. O que sabemos? Sabemos que no passado se fizeram vários disparates que permitiram a multiplicação de reformas precoces e generosas que hoje põem pressão sobre o sistema. Sabemos, ainda, que a demografia se alterou drasticamente, reduzindo o número de activos, por mais emprego que sejamos capazes de criar, e aumentando não apenas o número, mas a longevidade, daqueles cujas pensões de reforma quem está no activo tem de financiar. Tem havido várias tentativas de modificar o sistema para lhe conferir equilíbrio. Se são, ou não, suficientes é assunto envolvendo dimensões técnicas e opções políticas controversas. Também aqui a prudência aconselha que não se remeta a solução para um mítico crescimento que ninguém sabe se virá ou, vindo, se terá a intensidade suficiente. A crise também fez diminuir a emissão de gases com efeito de estufa. Para quê preocuparmo-nos?
Há assuntos em que, de tão importantes, o pragmatismo deve imperar. Como dizia, um destes dias, John Kay, no FT, "tal como o âmbito da medicina são todas e quaisquer terapias que possam ajudar o paciente".