Sócrates passou de animal político imbatível a cordeiro facilmente sacrificável no segredo das cabinas de voto. Resta saber se ressurgirá das brumas, depois deste Alcácer-Quibir.
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1 - Os eleitores foram chamados às urnas e, para além do PS, desancaram nas sondagens e nas análises. José Sócrates passou de animal político imbatível, em campanha e fora dela, a cordeiro facilmente sacrificável no segredo das cabinas de voto. A líder do PSD, até então tida como um pouco velha para o cargo, com uma imagem arruinada pela obsessão por défices e contas, rejuvenesceu e ameaça inundar o país com ideias. Um verdadeiro milagre das rosas, com a respectiva multiplicação de votos. Resta saber se das brumas virá ainda um José Sócrates capaz de reocupar o trono, depois de ter passado pelo seu Alcácer-Quibir.
2 - O favorito para as próximas eleições é o PSD. Embora de todo o lado surjam análises (e, não tardará, também sondagens) sugerindo cautelas e caldos de galinha. Como se o vencedor das eleições tivesse sido o PS. Não foi. Se as eleições europeias foram a primeira volta das legislativas, então quem parte na frente para o escrutínio de Setembro é o PSD. O PS não tem que tentar resistir, como se diz. O PS tem que tentar reconquistar o primeiro lugar aos sociais-democratas. Sendo que um líder entretanto derrotado terá sempre alguma dificuldade em demonstrar que é um vencedor.
3 - Convencionou-se que é arriscado transpor para legislativas os resultados de umas eleições europeias. Mas a verdade é que estas foram a mais fiável das sondagens. E portanto já houve quem calculasse como seria a distribuição de deputados na Assembleia da República, caso se repetisse o resultado saído das urnas a 7 de Junho. Pedro Magalhães, da Universidade Católica, apresentou assim as coisas no seu blogue pessoal (margensdeerro.blogspot.com): 96 deputados para o PSD (actualmente tem 75), 73 para o PS (121), 23 para a CDU (14), 21 para o BE (8), 16 para o CDS (12) e 1 para o MEP.
4 - Nobre Guedes, que durante muitos anos foi uma espécie de líder espiritual do PP de Paulo Portas, já veio reafirmar a importância de uma coligação pré-eleitoral entre o PSD e o PP. Se se tiver em conta a distribuição de deputados apresentada no ponto anterior, verifica-se que os dois partidos somariam 108 deputados, a oito apenas de uma maioria absoluta na Assembleia da República (116 de um total de 230). A intenção não passará de ruído de fundo, o tempo é escasso para unificar listas. Mas ajuda a criar clima para um cenário de união pós-eleitoral.
5 - Um cenário incómodo, desde logo, para o PS, mas também para os partidos à sua esquerda. Aliás, BE e PCP já se batem contra um dos argumentos centrais da próxima campanha: a necessidade de concentrar os votos da esquerda nos socialistas, para travar uma vitória da direita. Vem aí o papão do voto útil. Louçã bem pode garantir que o PSD não tem condições para ganhar eleições, tentando contrariar a evidência da última noite eleitoral. O líder bloquista sabe que os seus eleitores são provavelmente os mais voláteis.