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Sei que com as recentes performances do partido de extrema-direita tem sido difícil darmos atenção à atuação do Governo. É difícil focarmo-nos em temas tão aborrecidos como a gestão do SNS, metas orçamentais, crescimento de receitas e blá, bla, blá, quando ao lado temos uns tipos a fazer malabarismos com as próprias fezes. É preciso um esforço de concentração muito grande e nem todos conseguimos.
Eu própria dei por mim a assistir à discussão do Orçamento de Estado enquanto fazia scroll no telemóvel e só o pus de lado quando o deputado Filipe Melo mandou uma deputada do PS para a terra dela. Há quem tenha dito que foi uma tirada do mais racista que há, mas tendo a deputada Eva Cruzeiro nascido em Portugal e crescido no Seixal, é possível que o deputado do Chega tenha querido chamar à atenção para o problema que é trabalhar no centro de Lisboa e residir na Margem Sul do Tejo com a qualidade de transportes que temos.
Mas temos todos de saber que, esta semana, o Governo se passou da cabeça. Na quarta-feira, propuseram aumentar o subsídio de refeição da Função Pública em 10 cêntimos por ano, a partir de 2027! E não é tudo. Em 2029, esperam que esse valor atinja a marca dos 6,30€! Não é espetacular? 10 cêntimos! Eu, porém, recomendo cautela. É que 10 cêntimos, pode levar a que os funcionários públicos não saibam o que fazer com tanto dinheiro e o comecem a estoirar à maluca. Atenção, estes trabalhadores precisam de alguém que os ajude a manusear esta fortuna. Ou querem que acabem como o Fábio Paim, que não teve cabeça e que por isso está hoje a fazer vídeos para o Only Fans? Alguém quer ver a dona Emília da secretaria a vender fotos de pés na internet porque geriu mal o seu subsídio de refeição? Temos de pensar nisto, até porque 2027 está já aí. 10 cêntimos! Se eu tivesse má vontade, diria que qualquer português consegue ser mais generoso quando alguém vem bater ao vidro do carro para pedir para a sopinha.
Ora, eu gostaria de ajudar a Função Pública a investir estes 10 cêntimos, mas bastou-me ir a um supermercado ou consultar uma tabela de preços num restaurante para perceber que é mais fácil dizer no que é que não podem gastar o aumento. Informo que não há qualquer pão que possam comprar, visto que o mais barato é o cacetinho, e se é a 20 cêntimos a unidade hoje, imaginem quanto será com a inflação em 2027. Água também não dá, porque a garrafinhas mais em conta são a 23 cêntimos. A menos que queiram fazer um plano de prestações para comprar uma Penacova. Pode ser este o caminho do futuro, atenção. Café está fora de questão, não só pelo preço, mas também porque com estes anúncios do Governo já estão nervosos e acelerados o suficiente.
Portanto, artigos para comer não dá, para beber também não, mas não desanimem porque na mercearia aqui ao pé de minha casa, se levarem cinco pastilhas Gorila, e não interessa o sabor, o senhor faz a 10 cêntimos cada uma. É perfeito. Mastigam, ficam com um saborzinho na boca e o estômago fica com a ideia de que comeu qualquer coisa. É como o airGuitar mas com comida. E depois como também não comem nem bebem muito, não têm tanta necessidade de se levantarem para perder tempo a fazer necessidades.
Infelizmente, os sindicatos que lutam por melhores condições têm vindo a perder algum fulgor nos últimos anos. A importância da defesa dos direitos dos trabalhadores e a diferença que faz a sua força coletiva para exigir dignidade laboral e salários justos para os que diariamente fazem o país andar para a frente, parece ser cada vez menos atrativo. Claro que a pressão que os patrões exercem sobre trabalhadores que são sindicalizados não ajuda. Mas sei lá, o mundo sindicalista precisa de um make-over. Precisa de ser sexy. Por exemplo: aqueles calendários que os bombeiros sapadores de Lisboa fazem todos os anos por esta altura também podiam fazer com sindicalistas conhecidos da nossa praça. Imaginem: Isabel Camarinha, ex-líder da CGTP, vestida de cabedal a pisar o pacote laboral do Governo, ou Carlos Silva, da UGT, em pose José Cid com um megafone no lugar do disco, ou até Mário Nogueira, da Fenprof, com o seu farto bigode, de tronco nu, a morder um apagador com ar maroto. Ficam as ideias.
Quando o deputado Filipe Melo mandou uma deputada do PS para a terra dela, há quem tenha dito que foi uma tirada do mais racista que há. Mas tendo Eva Cruzeiro (foto) nascido em Portugal e crescido no Seixal, é possível que o deputado do Chega tenha querido chamar à atenção para o problema que é trabalhar no centro de Lisboa e residir na Margem Sul

