Não é de bom tom, em dia de reflexão, dedicar espaço à luta político-partidária caseira.
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Se não for por se estar de acordo com uma lei anacrónica (as propostas, apelos ao voto, desconsiderações ao adversário estão permanentemente ao alcance, na vastidão da Internet), pois que seja por uma questão de higiene mental (a exposição excessiva à poluição e retórica eleitoral é prejudicial). Mas isso não invalida que se fale sobre eleições. Porque há uma realidade que podemos dar por adquirida: quase metade dos eleitores não vai comparecer, amanhã, para exercer o seu direito de voto. A abstenção é um fenómeno perturbador (com uma ou outra exceção, como uma deslocação temporária para longe de casa ou uma situação de doença ou incapacidade). Sejam quais forem as causas para a desafeição, não se resolvem seguramente com a recusa de participar na escolha de um modelo político. Bem pelo contrário, quanto maior o número de abstencionistas, mais fragilizado ficará o melhor de todos os modelos de governação que conhecemos: a democracia representativa. Porque os representantes podem ser a parte mais visível, mas esvaziam-se se não houver representados. Mesmo que não se apercebam ou não queiram saber (como parece ser demasiadas vezes o caso). Não vale a pena aspirar a taxas de abstenção como a da eleição para a Assembleia Constituinte (8,5%), ou mesmo nas primeira eleições legislativas (16,7%). Mas chegarmos ao ponto de registar 44% de ausências nas mesas de voto, como aconteceu na legislativas de 2015, deveria fazer disparar sinais de alarme. Não apenas entre os políticos (que gostamos de responsabilizar em exclusivo por todas as disfuncionalidades do país e do Mundo), mas sobretudo entre o que chamamos sociedade civil. Ao prescindirem de alguns dos seus direitos de cidadania, como o direito a votar e escolher os seus representantes, a possibilidade de influenciar o destino coletivo, os abstencionistas, em particular os que a praticam com militância, estão na verdade a acantonar-se numa categoria inferior de cidadãos. Alguns, talvez a maioria, refugiam-se naquelas ondas regulares de indignação que varre a redes sociais. Não é lugar que se recomende.
Chefe de Redação