Vem aí mais um Orçamento do Estado. Num país com as características de Portugal, é um momento de uma importância desmesurada.
Corpo do artigo
Temos um número elevado de funcionários públicos (se incluirmos as suas famílias, são milhões de pessoas cuja qualidade de vida depende dos salários que o Estado paga); temos cada vez mais pensionistas (a maioria sem poupanças dignas desse nome e que dependem, portanto, da solvência e pontualidade da Segurança Social); temos quase dois milhões de pobres (que viveriam na mais absoluta miséria, não fossem subsídios como o abono de família, o rendimento social de inserção ou o complemento solidário para idosos); e temos, finalmente, muitas pequenas, médias e grandes empresas, em particular na região de Lisboa, que dependem do investimento público, dos contratos com o Estado, ou dos salários e subsídios que este paga aos seus clientes.
Para qualquer partido com pretensões a manter o poder, este é, portanto, "o" momento. Sobretudo, quando estamos a meio do ciclo político: depois de eleições autárquicas que apontam para algum desgaste (mesmo que ligeiro) e a dois anos das legislativas. Bem pode o presidente da República pedir uma alternativa forte à Direita (por coincidência a sua área política). Bem pode alertar que o 17 mil milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência não são um "monopólio" do PS.
Quem tem a faca e o queijo na mão é António Costa. Não é preciso ser um génio da análise política para adivinhar que o primeiro-ministro saberá usar a primeira para distribuir o segundo, se não a toda a gente, pelo menos a gente suficiente para garantir, mais do que uma sobrevivência descansada, a reeleição em 2023 (se para aí estiver virado).
Acresce que, ultrapassada a pandemia, a economia volta a crescer. Por comparação (a memória é curta quando o que importa é sobreviver ao dia a dia), será sempre melhor que os últimos dois anos. E está aí a bazuca. Mesmo que o Governo não consiga gastar tudo a tempo (provável), ou que uma parte seja mal gasta (certo), será o suficiente para criar, pelo menos, a sensação de abundância.
Mais do que a "estratégia" que o presidente pede ao PSD e ao CDS, o próximo ciclo depende quase exclusivamente da capacidade de execução (e propaganda) de António Costa.
*Diretor-adjunto