Hoje deparamo-nos com uma indústria extrativa em meio urbano. Tudo tem sido extraído do centro da cidade.
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Primeiro as funções, depois as habitações e as populações. E com essa extração tudo se perdeu: atividades do quotidiano, vivências sociais, locais de sempre, relações de proximidade, afetos de vizinhança, vida na cidade. O comércio cuidador também está a perder-se. Aquele que durante décadas sempre se relacionou com quem vive, acompanhando as rotinas e cuidando a vida dos clientes.
No Porto, já perdemos os cafés mais históricos, e os que não perdemos deixaram de ser para nós. Perdemos mercearias, drogarias, livrarias. No sábado fui ao Armazém dos Linhos, onde sempre comprei os tecidos para os momentos mais preciosos da minha vida, quando soube que vão fechar, para dar lugar a um empreendimento turístico.
Desde 1905 que servia várias gerações. De pé direito alto, brilhavam as bobines de múltiplas cores, dos quadradinhos às riscas das chitas, num mobiliário de madeira polido. Com atendimento mega personalizado, sempre se diferenciou nos lindíssimos e simples embrulhos, em cartuchos de papel grosso e apertados em fios de tecido. Numa era de exigência sustentável nos consumos, como podemos trocar estas peças de fabrico tradicional, que duram uma vida, pelas que agora são feitas para usar e deitar fora e de marcas pouco recomendadas ao nível dos direitos humanos?
Fiquei triste. Engoli em seco. E vieram-me lágrimas aos olhos. Apelo a quem de direito para este tema. As lojas históricas são património, a identidade e a alma da cidade. É preciso atuar.
* Especialista de Mobilidade Urbana