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Incomum e por isso notícia: as estatísticas de homicídios em Portugal ficaram nas últimas 24 horas mais carregadas de negro. O assassinato de seis pessoas - uma sétima escapou por pouco à morte - faz tocar as campainhas de alarme. Uma análise simplista apontará para uma mera coincidência no número de crimes registados num único dia. Os contornos da análise ganham no entanto outra amplitude quando se conclui pela subida exponencial da quantidade de homicídios, os quais já correspondiam a uma taxa superior a 50 por cento no primeiro semestre quando comparado com período homólogo do ano passado.
Por trás de cada homicídio há, em regra, uma história de convulsão nos comportamentos societários tidos por normais. O coquetel de desgraças faz-se em regra de crimes passionais ou vinganças no submundo da droga, mas estão a engrossar os (maus) argumentos materiais: à tradicional disputa pela posse de terras agregam-se cada vez mais razões de natureza económica, sejam elas de puro e simples desvario perante uma falência ou, então, a ganância pela posse de património, dando-se o caso de a loucura, nestas situações, não ser propriedade exclusiva de uma única classe social - trespassa pobres, remediados e ricos.
O aumento do número de homicídios, seja como for, não é casuístico. Radica numa sociedade capaz de juntar a perda de valores ao pior da competitividade. E, naturalmente, exponenciam-se mais os riscos de registos de desgraças sempre e quando se agravam as condições económico-financeiras. As falências de empresas e famílias, a perda de padrões de qualidade de vida, a escassez de horizontes de esperança, enfim há uma panóplia de motivos proporcionadores de um risco mais elevado para se assinarem disparates. A vida não tem preço e, como tal, nada pode justificar os disparates irreversíveis para terceiros, por mais rarefeitos que possam ser também os bastiões culturais.
Vale a pena, em todas as circunstâncias, proceder a uma ponderação do agravamento dos fatores de risco sem dramatismos. Priorizando-se a pedagogia.
Na senda de outros índices de criminalidade, não obstante as percentagens de homicídios estarem a galopar, Portugal é (ainda) um país pacato, se comparado com outras realidades europeias ou à escala planetária. Uma simples análise aos relatórios da Agência das Nações Unidas para a Droga e o Crime (UNODC) retira quaisquer dúvidas: a Itália, a Espanha ou a Sérvia são bem menos recomendáveis no Sul da Europa e as grandes metrópoles das Américas ou de África são mesmo casos nos antípodas...
Portugal tem fama de ser um país de brandos costumes. Convém também ter proveito.