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A troika está de partida e as contas a ser feitas. Mais em função de uma qualquer utilidade que possa ser valorizada eleitoralmente do que propriamente por aquelas "contas à moda do Porto" de que tanto nos orgulhamos. De resto, nestes três últimos anos, o que mais mudou foi seguramente o preço do trabalho, que foi desvalorizando, e também o preço do merecido descanso, que se tornou mais caro para quem se reformou de uma vida de trabalho por conta de outrem. Para além desta magna constatação de facto, talvez valha a pena pensar em que medidas e em que prazos o trabalho poderá ser revalorizado, desde logo em benefício do valor ético, mas também como fator de crescimento económico por via do consumo e de sustentação do modelo de solidariedade por via dos descontos para a Segurança Social.
É claro que o trabalho não se revalorizará apenas porque formalmente a troika se vai embora. Para que isso aconteça vai ser preciso que nasçam milhares de empresas altamente especializadas, tanto melhor se vocacionadas para as exportações, e que, ademais, não se encastelem nas áreas tecnológicas e se possam instalar na agropecuária, nas florestas, nas pescas, nas indústrias transformadoras, nos turismos, provocando assim um efeito de alastramento suscetível de dar uma nova capilaridade ao mercado do trabalho.
É disto que deve tratar a política, melhor ainda as políticas de futuro: a criação de um novo perfil para a economia portuguesa. Sem este desígnio, o qual não dispensa a mão do Estado, uma mão amiga naturalmente e não de ferro, correremos o risco de daqui a cinco anos termos os nossos jovens, aqueles que resistiram à emigração forçada, a reclamarem uma governação ditada de fora, por uma outra troika qualquer.
Não se trata de romancear o futuro, apenas de o tomar em mãos. A partir da simples constatação de que o que esta troika nos deixa de melhor são condições que não dependem tanto assim da nossa vontade de as manter ou até melhorar. Desde logo, os baixos juros da dívida desde que o presidente do Banco Central Europeu garantiu defender o euro por todos os meios, o que decididamente atraiu muito do capital financeiro em refluxo da sua deriva especulativa por países emergentes (ou mesmo mafiosos). Mas também, como é óbvio, o nível de exportações, que superou o das importações num quadro cuja evolução depende em elevado grau dos comportamentos dos grandes mercados, seja o europeu ou o norte-americano, cuja proclamada junção carece de um tratado que levará ainda o seu tempo a desenhar e sobretudo a aplicar em plena confiança mútua.
Paradoxalmente, está mais nas nossas mãos melhorar o que de pior nos deixa a troika: a taxa de desemprego, a carga fiscal e os 300 mil emigrantes que não deixarão de nos fazer falta, e tanta!, daqui por uns anitos, quando tivermos uma população residente inferior à da Catalunha.