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Credibilidade é o que se nos pede, possivelmente numa dose irracional, se pensarmos quão difícil será levar o nosso défice dos 9,3 actuais para 3% em 2013
O quadro perante o qual os portugueses foram postos esta semana é bem negro: um défice muito elevado, um crescimento económico reduzido, uma dívida pública assustadoramente crescente, uma taxa de desemprego que já não consegue esconder que passamos claramente para os dois dígitos. Como na Função Pública o aumento será de zero por cento, os portugueses sabem o que os espera, pois o sector privado, o que puder aumentar salários, terá esse zero como Norte. Não se aproximam tempos fáceis. Os contabilistas de Bruxelas dizem-nos que em 2013 teremos de ter o défice abaixo de 3%. Estando nós nos 9,3%, imagine-se o que será o futuro próximo.
É cedo, possivelmente, para sermos pessimistas. O Governo acaba de dar um sinal de abertura para o diálogo a que corresponderam PSD e PP que, abstendo-se na votação do Orçamento, garantem que à crise económica não se junte uma desnecessária crise política. Mas não chega. Ainda que tal procedimento signifique uma acalmia, a oposição do arco do Poder vai ter de fazer mais. Quando a crise apertar, quando as manifestações forem muitas (a recente dos enfermeiros é apenas um pequeno exemplo), de que lado vão estar? Os partidos que assumiram a continuidade do Governo vão ter de resistir a essa tentação de estar ao lado do povo na rua, como aconteceu com os professores, por muito inoportuno que isso lhes possa parecer de um ponto de vista estritamente eleitoral.
Mas é preciso um pouco mais. A palavra credibilidade ganhou uma nova urgência. Pouco importa que as agências de rating que ameaçam fazer-nos a vida negra encarecendo ainda mais o dinheiro sejam as mesmas que se enganaram redondamente na avaliação da situação em plena crise mundial. Credibilidade é o que se nos pede, possivelmente numa dose irracional, se pensarmos quão difícil será levar o nosso défice para os 3% em 2013. Nestes tempos, não será muito correcto citar Jorge Sampaio - há vida para além do défice, disse ele um dia. Pois há. E há também outras maneiras de o combater para além da métrica apertada de um orçamento. Todo o nosso Estado precisa de uma profunda reforma que não poderá ser obra de um partido só.
Mas, pelos vistos, desta vez, o PS e os partidos à direita só estavam disponíveis para garantir a estabilidade politico-partidária, a chamada mercearia eleitoral. Para mal de nós todos, vamos continuar à espera.