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Só vi dois dos três debates agendados, mas a não ser que o último nos traga muitas surpresas não será pelos debates que se descortinará o próximo candidato a candidato...
A condução das conversas foi muito semelhante, o que não ajudou à construção de uma distinção, ainda que Clara de Sousa tenha tentado descolar do tom de guerrilha pessoal a que se agarrou Judite na noite anterior.
Foram meia dúzia os temas abordados e, em minha opinião, muito equivalente o resultado. Senão vejamos.
A confissão clara a que Judite de Sousa forçou António José Seguro quanto à deslealdade e traição de que se acha vítima terá colhido mais do que o imperativo de consciência abnegado com que António Costa retorquiu. António José Seguro manteve tempo demasiado o tom de Calimero mas que ficou a ideia de uma certa "esperteza" de António Costa, isso parece-me que sim.
Já a ideia do mau resultado do PS nas Europeias que teria estimulado a consciência de António Costa, essa parece-me ter sobrevivido claramente à rigorosa contextualização europeia que Seguro faz da sua vitória. A ideia de que a vitória socialista portuguesa está muito bem colocada em termos europeus não sobrevive à contradição assumida pelo próprio secretário-geral quando diz que o resultado mostra que o PS não foi capaz de canalizar o descontentamento feroz dos eleitores.
Veio depois a herança Sócrates. No primeiro debate, António José Seguro conseguiu colar o alegado desatino dessa governação a Costa, enquanto ele, António José Seguro, se soterrava heroicamente debaixo do preço que foi preciso pagar; mas no segundo debate, já António Costa se refazia e lhe mostrava que várias dos projetos ou ideias para futuro que apregoava não eram senão consequência de políticas do Governo do ex-secretário- geral. Se não descolou por completo pelo menos manteve a ideia, mais sensata, de que houve coisas boas e coisas más.
Mas nisto de ideias para o futuro (talvez mesmo o único ponto que merecia ser debatido e talvez chegasse um só debate) também não se pode dizer que tenha existido um vencedor claro. António Costa consegue explicar melhor uma estratégia, mas Seguro terá pelo menos as seis medidas e meia (das 80 que reclama) melhor explicadas e estudadas.
E se calhar não pode ser muito diferente. Que coelho poderá ter Seguro na cartola que o leva a pôr com tanta facilidade a cabeça debaixo do cutelo? Falo dos impostos e da extraordinária segurança da promessa de António José Seguro. E aí teve mais razão António Costa.
Quanto às coligações, se forem necessárias, a metodologia mais correta pareceu a de António José Seguro - estabelecer princípios claros que não podem ser traídos pelos "coligáveis". António Costa foi menos claro, mas conseguiu fazer passar a ideia de que afastava qualquer coligação com os maus da fita (os partidos do actual Governo). Com isso, encostou-se mais à Esquerda.
A mensagem final foi mais pragmática e um bocadinho menos repetitiva do lado de António Costa, mas não sei se não pegará o tom bem-intencionado das frases "mudar a forma de fazer política", "separar os negócios da política", " honrar a palavra", "não deixar que sejam sempre os mesmos" que usou António José Seguro. Não sei, porque uma coisa é o povo em geral e outra apenas o povo socialista, militante ou simpatizante.
É que com tantos debates em canais de sinal aberto a gente até se esquece que isto é coisa de um partido. As primárias nos EUA também têm este tipo de cobertura?
Seja como fôr, ou muito me engano, ou quem faz parte de um partido escolhe de forma nua e crua quem tem mais possibilidades de ganhar. E para isso, seja racional ou não, parece-me que conta muito a capacidade de resolver problemas e um discurso que soe a libertação das amarras. E aí os resultados na Câmara Municipal de Lisboa e a maior distância da gestão do dossier troika beneficiam António Costa.
Seguro lutou para sobreviver a um período muito difícil, manteve uma proximidade heróica das bases mas corre o sério risco de ter de passar o testemunho sem cruzar a meta porque pura e simplesmente não consegue convencer.
A vida pode ser injusta? Pode!