O tema não é novo, mas como tudo o que implica descentralização continua a ser varrido para debaixo do tapete.
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A OCDE publicou logo no início da crise sanitária um estudo - The territorial impact of covid-19: Managing the crisis across levels of government - em que chamava a atenção para a dimensão territorial da pandemia e para a necessidade de articulação do seu ataque através dos vários níveis da governação.
Nesse estudo demonstra-se que em todos os países onde o modelo de governação o permite são os níveis subnacionais que desempenham o papel fundamental na gestão de todos os elementos de combate à propagação do vírus, desde a mobilização de ferramentas digitais para o tracking das cadeias de infeção, organização de campanhas de testes localizadas e produção de informação para a alimentação da cadeia de decisão no sentido "bottom-up".
Como consequência, os mecanismos de apoio económico e social têm igualmente uma componente fortemente regionalizada uma vez que são evidentemente diferentes os custos de uma região atingida em comparação com as que são relativamente poupadas.
O mapa da infeção em Portugal mostra, à evidência, que são a Região Norte e a Região de Lisboa e Vale do Tejo os territórios, de longe, mais afetados. E, nestes, a progressão da pandemia não é, ainda, igual.
Pelos dados de que dispomos na Região Norte são neste momento preocupantes alguns concelhos do Vale do Sousa e o Porto. Cerca de cinco em 86. Ou seja, mesmo dentro da Região Norte, a situação é muito desigual requerendo atenção e meios com enfoque diferenciado.
Nada disto é, para variar, tomado em consideração. O ataque à pandemia continua a ser essencialmente centralizado enquanto o discurso público oscila entre o "nós é que sabemos" e "a responsabilidade é de cada um"!
Segundo o presidente da Associação Nacional de Saúde Pública, há falta de autonomia (e de meios) para recrutar elementos de reforço às equipes de rastreio dos surtos, há médicos exasperados a preencher tabelas múltiplas para alimentar o sistema de informação central, há impedimento de comunicação direta com as comunidades antes que tudo seja validado superiormente .
Num país tão pequeno, onde apenas duas regiões são foco de intensa preocupação, os nossos governantes insistem em não pôr nas mãos das equipas locais o grosso do ataque ao problema.
E temo bem que a legitimidade acrescida dos novos presidentes das Comissões de Coordenação não seja suficiente para dar um murro na mesa.
*Analista financeira