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O mundo ganha mais em integrar em organizações internacionais ditaduras como a da Guiné Equatorial do que em ostracizá--las. Para que, nem que seja por "contágio", empreendam mudanças
Anda por aí um clima de indignação perante a perspectiva de a CPLP aceitar a Guiné Equatorial como membro de pleno direito da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). É uma indignação que parece justa, mais em atenção à natureza facínora do regime de Obiang Nguema do que à ausência de expressão lusófona na antiga possessão espanhola, que por acaso até fez parte até 1778 do Império Colonial Português. Mas é uma indignação curta de memória e estreita de vistas.
Pela falta de memória, responde o facto de a Guiné Equatorial, que tão afanosamente anda a "pescar" areópagos internacionais para conquistar galões, já fazer parte da CPLP como país observador associado.
Ninguém notou, quando foi admitido, que já então não cumpria os critérios - estatutários - relativos a práticas democráticas, "boa governação" e respeito pelos direitos humanos"? Ou - e aqui já entra a visão estreita, para não dizer envergonhada - só não se levantou a lebre para evitar que alguém atirasse, inocentemente, a pergunta: e Angola, membro efectivo, cumpre os critérios?
A questão central não será, portanto, avaliar o grau de cumprimento de credenciais democráticas. A União Europeia pratica há anos esse desporto com a Turquia e assim a vai mantendo em lume brando, na expectativa de um dia vir a vestir a sua camisola. Pragmática, a CPLP dispõe-se a acolher quem queira entrar, ignorando as suas próprias normas. É esse o sentido da declaração de Ramos-Horta, quando afirma que não lhe cabe emitir atestados de democracia, se nem a ONU o faz.
O que importa avaliar é se o Mundo ganha mais integrando em organizações internacionais ditaduras como a da Guiné Equatorial ou votando-as ao ostracismo e dando-lhes oportunidade de se vitimizarem. Parece mais sensato absorver tais países. Para que, nem que seja por "contágio", empreendam mudanças internas.
Sucede que este seria um desafio demasiado exigente para a CPLP, que tem funcionado como mero fórum de países que usam a mesma língua. Para atingir outro estatuto, adquirir verdadeiro peso político na cena internacional, ainda tem muito caminho a percorrer.