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Foi ao ver (finalmente) o filme “Mulheres do século XX”, por estes dias, que me ocorreu voltar à velha reflexão em torno da clássica pergunta: como é que se criam homens feministas? Parece uma coisa simples de responder, mas não é. Criar mulheres feministas, desde a infância, parece-me mais linear. Passará muito por contrariar os condicionamentos culturais e educar meninas de autoestima forte, solidárias umas com as outras, capazes de priorizar o seu bem-estar e o cumprimento dos seus objetivos pessoais. Claro que criar mulheres feministas não garante que a sua vida seja fácil, enquanto a nossa cultura e, portanto, o nosso mundo continuarem a ser desiguais, mas pelo menos a consciência das coisas e as ferramentas de resistência estarão transmitidas.
Ora, se no caso da criação das meninas o segredo é “puxar para cima”, reforçar positivamente, empoderar e abrir o horizonte de futuro e ambição, no caso dos rapazes fazemos como? Sendo este mundo já tão celebratório dos códigos convencionais da masculinidade, tão legitimador das ambições masculinas, tão valorizador das características que habitualmente se estimulam na criação dos homens, criar homens feministas seria “puxar para baixo”? Ora, nenhuma mãe quer criar um filho podando a sua autoestima, ambição ou à-vontade, portanto tolher não será a via certamente.
Como é que se equilibra a balança, enquanto não alcançamos a neutralidade de género na educação (porque em casa até podemos garanti-la, mas fora de portas isso é ainda uma miragem), sem podar um lado, enquanto puxamos pelo outro? E se não temos o controlo total sobre a educação dos nossos filhos, porque os criamos sempre em comunidade, com todas as influências do meio e dos pares, como é que trabalhamos em casa para que as bases sejam o mais compensadoras possível do viés que vigora no mundo real?
Não tendo as respostas, porque educar é mesmo um exercício de grande humildade, acho que pensar nos rapazes que não correspondem ao estereótipo de masculinidade vigente é uma boa pista. Pois a legitimação dos seus interesses mais “alternativos”, a aceitação da sua vulnerabilidade e o estímulo para que expressem as suas emoções são o reforço positivo que constrói autoestimas fortes, ao arrepio do que é a norma da masculinidade viril e competitiva. Acredito que a chave para criar homens feministas é, antes de tudo, criar homens sensíveis e empáticos, validando outras formas de masculinidade, isentas da toxicidade padrão. Ou, por outras palavras, libertar os homens do machismo cultural vigente. Até porque libertar é sempre melhor que tolher.