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Às vezes, a Justiça vive numa casa pequena. Mas, mesmo num espaço exíguo, dá-se a luxos. Muito à semelhança do apartamento liliputiano de André Ventura. Acanhado em 70 m2 (e não 30). Porém, com piscina e jardim.
A pequenez da Justiça revela-se em casos como aquele em que um homem de 33 anos foi ilibado após pedir no Instagram uma foto de corpo inteiro a uma menina de 14. Absolvido por dois tribunais, note-se.
O Tribunal de Oeiras e, posteriormente, a Relação de Lisboa consideraram que o pedido de uma imagem integral do corpo não tinha conotação sexual. Para haver crime seria necessário que a vítima estivesse nua ou que fotografasse alguma parte específica, argumentam os juízes.
A questão que fica por responder é simples: que outro motivo teria um homem adulto para pedir uma foto de corpo inteiro a uma criança?
Neste caso, a menina salvou-se. Felizmente, bloqueou o contacto do atacante e alertou os pais para a situação. Menos sorte têm as crianças que são vítimas de crimes sexuais online e no mundo real. Uma em cada cinco, dizem as estatísticas. Só em Portugal, entre 2022 e 2024, foram contabilizados pela APAV mais de cinco mil crimes.
Os juízes classificaram o comportamento do homem como “desapropriado” e admitem que “sempre ficará a dúvida” sobre o que se poderia seguir.
Se aqueles juízes não conseguem ver intenção sexual num pedido de foto de corpo inteiro a uma menor, percebe-se que podem não ter espaço para proteger uma criança de um predador digital, mas dão-se ao luxo de expor argumentos criativos.