"Agora foi de vez! Não é possível o retorno ao passado. As empresas que faliram, faliram. Os postos de trabalho que se perderam, não voltam mais. Talvez uma parte, mas todos, não. Há muita concorrência. Quando se está em crise, as pessoas poupam. Querem barato. Nós não temos preço. E os que fazem barato hoje, fazem bons produtos amanhã".
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"Estou a perder dinheiro há quase um ano. Temo-nos aguentado pois tínhamos uma situação desafogada. Mas só dá para mais dois ou três meses e, mesmo assim, teremos de fazer um lay-off. Se as coisas não arribarem, lá para Setembro é inevitável o despedimento colectivo. É a maneira de salvar os outros postos de trabalho! Qual vai ser a minha cara? Sou da terra, conheço aquela gente. E não há mais ninguém a investir".
Mais palavra, menos palavra, assim me contava, um empresário a situação da sua empresa. Desalentado. Uma empresa de referência, com uma importante quota no segmento de mercado que serve. Reconhecida pela qualidade. Presente em lojas de gama média-alta, nos principais mercados.
O problema não é o produto. "Entre os melhores. Reconhecido". Nem a eficiência. A produtividade é elevada. Reorganizar o processo produtivo? Melhorar a logística? "Às vezes as crises tornam possível o que, em alturas normais parecia um sonho. Foi assim há uns dez anos. Agora não! Já estudamos várias alternativas. O problema é mesmo o mercado. Nem cá dentro, nem lá fora. Ninguém compra nada. Quando compram, mesmo os clientes tradicionais, ficamos com o credo na boca. Será que vão pagar? Que se aguentam? Já não é o primeiro que vai ao charco!"
Pergunto-lhe pelo seguro de crédito. Cada vez menos e mais caro. "Eu percebo-as" diz, referindo-se às seguradoras. "No lugar deles se calhar fazia a mesma coisa. O risco é grande. E eles não são a Santa Casa da Misericórdia. Se é importante aguentar as exportações, o governo tem de encontrar uma forma de cobrir o risco adicional. E além disso há os aspectos sociais. Já viu como fica o Norte se isto não dá a volta depressa?", interroga-me. "O governo tem de fazer alguma coisa ou isto ainda acaba mal. A compra da COSEC parece uma boa ideia. Vamos a ver se resulta e se passamos a ter mais algum apoio. É que vontade não nos falta".
Sugiro-lhe novos mercados. Não se mostra particularmente entusiasmado. "Pode ser solução para outro tipo de produtos. Nós trabalhamos com lojas e marcas de referência. Poucas estão presentes nesses novos países. Mas estamos atentos". E louva o esforço da AEP e da AICEP. "Não é por aí que as coisas correm mal".
Tento arrancar-lhe sugestões. Diz-me que se houvesse uma redução, ainda que temporária, da taxa social única ("mas tinha que ser aí para metade"), seria possível evitar algum desemprego. "Não percebo qual a razão para não o fazerem. Assim, o pessoal vai para o desemprego e o Estado gasta mais com o subsídio do que o que perdia se baixasse a taxa para metade. Fazíamos um pacto: eles baixavam e nós não despedíamos". E num desconsolado encolher de ombros, confidenciou: "Já não sei o que é dormir bem há uns meses. Custa-me pensar que a obra de uma vida pode ir por água abaixo. E os trabalhadores? Eu ainda tenho umas poupanças, os filhos criados e estou quase na reforma. E eles?".