Ainda é cedo para dizermos se a sublevação popular em Cuba vai conduzir a um novo tempo político, económico e social. Sobretudo porque a ditadura comunista que governa a ilha há décadas tem conseguido sempre encontrar um expediente que garanta a sua sobrevivência e a eternização romântica do "pátria ou morte", frase-bandeira celebrizada por Che Guevara em 1964 que continua a ser muito popular em t-shirts do mundo ocidental, mas que não tem feito outra coisa senão arrastar o povo da ilha das Caraíbas para a miséria.
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Em 2016, na mais recente visita que efetuei ao território, os jovens já comentavam entredentes que seriam a Internet e as redes sociais a mudar o país. Era vê-los, aos magotes, colados aos edifícios dos hotéis internacionais, em busca de wi-fi. De Mundo. A tímida mas progressiva abertura do regime aos "vícios" do capitalismo, associada a uma mudança na liderança do Partido Comunista (saiu Raúl Castro e entrou Miguel Díaz-Canel), criou uma falsa expectativa de um novo tempo. Pura ilusão. O acantonamento ideológico não só se manteve, como o regime foi incapaz de aproveitar o momento favorável para se autorregenerar.
Naturalmente que o interminável embargo económico imposto há décadas pelos Estados Unidos da América (que nem Joe Biden suspendeu) tem ajudado a agravar as precárias condições de vida dos cubanos, mas só uma cegueira profunda pode permitir que se continue a usar essa desculpa para tudo. A pandemia só tornou mais evidentes as fragilidades estruturais do país. Sem eletricidade e sem vacinas, o povo saiu à rua, para gritar "liberdade" e "abaixo a ditadura". Como já não se via há 25 anos. Havana respondeu sem contemplações: deteve centenas, impediu o direito à manifestação, calou a liberdade de pensamento e desligou a Internet.
O anunciado fim do castrismo foi, está hoje à vista de todos, uma precipitação. Cuba continua refém de um regime que oprime e empobrece um povo que diz querer proteger acima de tudo e de todos, mas está também refém da coragem desse mesmo povo para promover uma ansiada mudança democrática. Mesmo que, para alguma Esquerda saudosista entre nós, seja difícil de entender, é possível gostar de Cuba e dos cubanos sem apoiar a ditadura que os mergulhou na idade das trevas. Pátria e vida. A hora é de liberdade.
Diretor-adjunto