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Vivemos um país assimétrico e desigual, grande na alma e dimensão mas pequeno na geografia da diferença quando parte da inteligência mandante da capital convive de mãos na anca, a olhar para baixo e sem esforço particular, agravando as discrepâncias entre as regiões através de um centralismo bacoco, próprio de quem não concebe outra visão que não a leitura macrocéfala e anoréxica do seu próprio corpo. Querendo ser o seu próprio guarda-livros. A disputa Norte/Sul esquece-se que tem o Centro pelo meio, o litoral que vai a banhos descuida-se com a desertificação do interior que se aproxima de Espanha ou de sítio algum a cada dia de abandono. E assim vamos, passo de enguia, prontíssimos para discutir as ilhas Selvagens com força semelhante àquela que usamos na guerra das Berlengas. A luta pelo território, pronta a erguer-se por pedaços de terra com uma área de 2,5 km2, precisamente nos pedaços de terra onde não vive gente. Diz a lenda ou a mera hipótese. Pode não haver gente que lá viva mas pode haver riqueza maior que se explore.
Não concebo a superioridade moral do cimento em relação à terra, mas sei bem que, havendo produtos agrícolas nas cidades, ainda não consta que repolhos cresçam nos Aliados ou no centro de Gaia. Malhas diferentes, tecidos diversos, a mesma dignidade: ao rural o que é da terra, às cidades o que é urbano. A posição de força tomada por Rui Moreira, Eduardo Vítor Rodrigues, Guilherme Pinto e Marco Martins (presidentes da Câmara do Porto, Gaia, Matosinhos e Gondomar) aquando da (não) assinatura dos contratos para os "Planos Estratégicos de Desenvolvimento Urbano (PEDU)" é mais do que uma manifestação de dignidade perante a falta de cumprimento e respeito pelos legítimos direitos das suas autarquias.
Parecem absurdos os critérios da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte (CCDR-N) na distribuição dos fundos comunitários relativos ao desenvolvimento urbano no âmbito do mais do que tumultuoso processo do "Programa Operacional Norte 2020". Agora, também em causa mais 20 milhões para a Região Norte. Que se somassem (o que era o caso) ou que se dividissem. Mas durante dois anos no jugo da "partidarite", poucos foram os autarcas que quiseram saber do que quer que fosse, enquanto se limitavam a olhar para o relógio. Daqui até à exoneração de Emídio Gomes foi um pequeno passo anunciado, mas sobra uma ideia que em muito ultrapassa um mandato que finde ou outro que comece: a Área Metropolitana do Porto tem de saber usar a palavra coesão de uma forma integrada. Nesta altura, está metida num saco e é de gatos.
A probabilidade de eleições directas para as áreas metropolitanas está na agenda política, como sistematicamente tem reiterado o ministro Adjunto Eduardo Cabrita. Independentemente e até em nome das dúvidas que se possam levantar sobre a validade da ideia no processo de descentralização do Estado, será imperativo que se comece a debater, desde já e a tempo, a bondade das razões.
O autor escreve segundo a antiga ortografia
*MÚSICO E ADVOGADO