<p>1 - José Sócrates mentiu-nos, mais uma vez. É a principal conclusão que se retira desta novela negocial em torno do Orçamento. Uma acusação leviana? Sugiro um esforço de memória. Recordo, em particular, uma das frases lapidares com que o primeiro-ministro justificou o ataque fiscal aos portugueses, a 29 de Setembro passado, no final da reunião do Conselho de Ministros: "São medidas que só se tomam quando não há alternativa". Continuando, Sócrates acabara de anunciar medidas como a taxa de IVA nos 23%; corte de 5% nos salários dos funcionários públicos; congelamento de pensões; fim do abono de família; aumento encapotado do IRS, penalizando as deduções fiscais.</p>
Corpo do artigo
E onde está a mentira? Foi destapada ontem, quando se anunciaram os termos do acordo entre o PS e o PSD. Afinal, ao contrário do que nos garantira o primeiro-ministro, com um "aperto no coração", há alternativa e até está contabilizada: são 500 milhões de euros que o Governo de José Sócrates cortará na despesa do Estado, em alternativa aos aumentos de IRS ou à inclusão do cabaz alimentar no escalão dos 23% de IVA. Voltemos à conclusão inicial: José Sócrates mentiu-nos, mais uma vez. Havia alternativa, mas preferiu, com enorme "coragem", o caminho mais fácil: aumentar os impostos e cortar benefícios sociais.
2. Guimarães vai ser, em 2012, Capital Europeia da Cultura. Como é costume, lá se criou um Conselho para administrar a coisa. O presidente da Câmara concluiu que seria justo pagar 14 300 euros mensais (mais carro e telemóvel) a quem se desse à maçada de presidir, outros 12 500 euros a dois ajudantes, e 2000 euros a um quarto elemento sem funções executivas. Tudo multiplicado e somado são 600 mil euros, metade do que a Fundação Cidade de Guimarães gastará por ano em salários até 2015. Sim, não é engano, o evento é em 2012, mas a tarefa prolonga-se até 2015. Vai ser preciso um trabalho esforçado, mas três anos deverão ser suficientes para arrumar as cadeiras, limpar os cenários e arquivar a papelada.
Mete-se uma crise pelo meio, com pacotes de austeridade, recessão e desemprego, mas tudo continua como dantes. Até que alguém dá com a língua nos dentes, apontando um suposto escândalo. Vai pedir-se uma opinião à ministra da Cultura, que patrocina o evento, e a custo nos diz que "não é aceitável", mas que não sabia de nada, porque se limita a ter um representante entre 15 no Conselho Geral (a 300 euros por presença em cada reunião). Ainda assim, recomenda que a situação seja repensada. António Magalhães, o socialista que lidera um dos concelhos do país mais castigados pelo desemprego, tranquilizou-nos. Apesar de se estar perante um "desígnio nacional", terá em conta a "conjuntura" e fará com que o "combate ao défice" tenha repercussões "na grelha de vencimentos". Fiquemos, pois, tranquilos.