O ralhete público do presidente da República à ministra da Coesão pode ter pecado pelo excesso na forma, mas o conteúdo só peca pela transmissão tardia. Portugal está com sérios problemas na execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), tendo libertado apenas 6% dos mais de 16 mil milhões de euros atribuídos pela União Europeia (UE). Mal estaríamos se o chefe de Estado aceitasse candidamente mais uma oportunidade desperdiçada.
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A um programa mal configurado, excessivamente dirigido a servir o Estado e suprir carências ao nível do investimento público, só faltava que a bazuca virasse pólvora seca e as verbas inscritas no programa não fossem aplicadas. Disso depende, desde logo, a boa execução do OE 2023, condicionado que está a um contributo robusto do PRR para atingir a taxa de crescimento económico prevista: 1,3%.
Esse é, porém, um exemplo do problema estrutural que representa a execução dos fundos comunitários em Portugal. O PT 2020, programa que ainda está em curso, beneficiou de um ano suplementar para ser operacionalizado, mas nem por isso a sua taxa de execução está hoje em níveis satisfatórios. Os 78% cumpridos terão de ser largamente acelerados até dezembro de 2023, para que país não tenha de devolver verbas à UE. Na mesma linha, o PT 2030 foi lançado com um ano de atraso e terá um período de execução mais curto que o anterior, o que significa que já estamos a ficar para trás, mesmo antes do programa ter começado.
A lentidão processual, a inércia burocrática ou a falta de quadros técnicos suficientes nas entidades gestoras dos fundos podem justificar parte do problema. Mas, do lado de quem concorre aos programas, continua a ser inquietante a complexidade das candidaturas, a ausência de respostas e a morosidade dos pagamentos. Tudo é lento demais, o que leva a que muitas empresas, pura e simplesmente, desistam dos processos, por não receberem os apoios no tempo em que deles necessitam.
Talvez seja altura de, à semelhança do plano de vacinação para a covid-19, ser criada uma task force para arrepiar caminho nos gabinetes e tirar os fundos europeus da gaveta. Sem sentido de urgência, não há plano que nos valha e corremos o risco de não trazer para cá o dinheiro que o país tanto necessita.
Presidente Associação Comercial do Porto