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As minhas fontes de inspiração croniqueira continuam a ser olhar o que se passa na cidade e as notícias do JN. Inesgotáveis.
Em época pós-pascal, li a magnífica reportagem sobre a encenação ocorrida em Soutocico (Leiria) com o “Enterro do Bacalhau”, cerimónia que tinha a ver com o fim da Quaresma, durante a qual, com a proibição do consumo de carne, restava à população comer bacalhau. E sete semanas a digeri-lo levavam à revolta e ao extermínio do dito.
O cerimonial ocorria em muitas localidades, incluindo o Porto. Um folheto de 1852, publicado por R.J.O.G., da Rua das Flores, 26, continha uma “Sentença de Morte Natural contra o Reo de Lesa Barriga Magriço Palhares Bacalhau”. Seguia-se o texto, repleto de humor, que começava: "Acordão em sessão no Monte Pedral. Vistos estes autos e documentos a ele anexos, prova-se que o reo (…), natural dos Bancos da Terra Nova, tem sido, como protestante, que é, verdadeiro flagelo dos estomagos católicos, declarando guerra à saborosa Vitela Mamota, ao sólido Lombo de Vaca, Paio do Alentejo, Presunto de Lamego e outras Viandas gostosíssimas (…)".
Seguia-se uma catilinária contra o réu, acusando-o de tudo e condenando-o à morte por enforcamento, no matadouro do Monte Pedral, sendo-lhe cortado o rabo e colocado na Praça do Anjo e as barbatanas no Cais da Alfândega. Antes, um Pregador exortava o condenado a arrepender-se dos pecados. Para aumentar a borga, os juízes eram: dr. Vacóri, Vitelo, Chibarro, Carneiro, Cabrito, Bode capado, Paio e Chouriço. Com imaginação, este espectáculo, num espaço da cidade, seria hoje evidente atracção pública.
O AUTOR ESCREVE SEGUNDO A ANTIGA ORTOGRAFIA