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Na sua raiz latina, a palavra caridade deriva de "caritas": amor. Ao longo do tempo, devido à forma crítica de entender o assistencialismo a quem precisa de ajuda, a palavra foi ganhando uma conotação negativa. Hoje fala-se em caridade e há quem sinta um calafrio ou esboce um sorriso trocista. Caridade soa a esmola. Ao ato de dar sobras ao outro. Perpetuando uma relação de desigualdade e de dependência.
As palavras nunca são neutras. E algumas conseguem anular o efeito produzido por ações. Ou pelo menos contaminá-las. Isabel Jonet tem décadas de dedicação a uma causa. O Banco Alimentar Contra a Fome tem sido a chave para minimizar os efeitos da pobreza junto de milhares de famílias. E no entanto lapsos que alimentaram acesos debates nas redes sociais, à volta do tamanho de bifes ou do desemprego, colaram-lhe à pele etiquetas injustas.
É verdade que as intervenções de Isabel Jonet são dadas a pormenores com todos os ingredientes para se agigantarem. Preconceitos e juízos que coabitam com a sua generosidade. Basta ir à recente entrevista concedida ao "Observador", a propósito de mais uma campanha que este fim de semana esteve nas ruas. Referindo-se ao facto de o Banco Alimentar nunca ir diretamente às pessoas, passando pelas instituições como forma de promover a mudança, a certa altura Jonet dá como exemplo que "as mulheres podem ensinar a cuidar da casa". Melhor teria sido dar exemplos sobre educação, apoio à inserção no mercado do trabalho ou outro que fosse além dos chavões sobre o papel da mulher.
Há, muito além das dissonâncias sobre as palavras, visões ideológicas e políticas do que deve ser a luta contra a pobreza. E assumiu-se que a caridade, a tal esmola à qual se torce o nariz, é uma antítese da transformação social. Como se não devesse fazer-se uma e outra coisa ao mesmo tempo: investir tudo em combater a desigualdade, ao mesmo tempo que se partilha o que se tem. Com amor, para voltar à raiz das palavras.
Carlos Farinha Rodrigues, professor do Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade Nova de Lisboa, fez as contas ao impacto do programa da troika e concluiu quem mais sofreu: os 10% mais pobres do país perderam 23% dos rendimentos. A desigualdade é um problema sério em Portugal. São diversos caminhos para a combater, mas a responsabilidade é seguramente coletiva. Vale a pena cada um responder honestamente à pergunta. E tu, o que fazes para tornar o Mundo melhor?
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