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Durante largos meses, o silêncio foi a melhor estratégia do almirante Gouveia e Melo para alimentar a imagem de candidato presidencial imbatível. Geriu centenas de notícias e comentários especulativos, deixou que Marques Mendes se posicionasse quase um ano antes da ida às urnas, manteve-se discreto enquanto outras vozes o conduziam para a frente de combate.
Os problemas começaram quando teve de vestir integralmente a pele política. Assumiu-se como candidato em plena campanha eleitoral para as legislativas. Deu que falar devido a um almoço indigesto com André Ventura. Mostrou um entendimento muito próprio dos poderes de Belém ao afirmar a tese de dissolução ou demissão quando um Governo não cumpre o "contrato" com os eleitores. Ora evitou posicionar-se, ora divergiu a definir-se politicamente, entre o socialismo democrático e a social-democracia mas com pavor de ser colocado à Esquerda.
A polémica sobre os bastidores da sua decisão de ser candidato e a medição de egos com o atual presidente da República ficarão sujeitas à interpretação de cada um. Mais do que esses casos de "pequena política" ou "pequena intriga", para usar as palavras do próprio, o que sobressai é a insistência de Gouveia e Melo em afirmar-se como alguém puro e intocado pelos maléficos partidos. Da imagem do cavalo de Tróia às ameaças de um coice para apear quem tentar aprisioná-lo, sobressai uma tese impossível: os partidos são necessários na vida pública, mas proibidos para chegar a Belém. Querer tanto estar fora do sistema torna-o intérprete de uma nova forma de populismo, que repete frases ocas como "o meu partido é Portugal". Aproximam-se os debates. Preparem as pipocas.

