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Duas semanas depois, a eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos da América continua a constituir um trauma para democratas do Mundo inteiro, demonstrando a verdadeira natureza universal das eleições presidenciais norte-americanas e das suas consequências. Os primeiros sinais do novo presidente eleito são altamente contraditórios, correspondendo aliás à sua idiossincrasia profunda (habituemo-nos!), entre uma certa amenização do discurso nalguns dos temas mais polémicos e a confirmação das suas intenções noutros. Um dos dados mais inquietantes dos primeiros dias que se seguiram à eleição tem que ver com o aumento registado - e devidamente noticiado pelos média - nos crimes de ódio (de natureza racial ou de género) em território norte-americano.
A eleição de Trump é um óbvio sinal de rejeição dos norte-americanos em relação a um sistema que sentem cada vez mais distante e cada vez menos ao serviço das pessoas. E esse é um sinal, mais um, que deve ser escutado com atenção e com humildade por todas as democracias, cada vez mais vulneráveis aos populismos de diversa natureza. E, depois de escutar e assimilar, é preciso atuar. Como? Daniel Innerarity, o conhecido filósofo político espanhol, cujas reflexões merecem sempre uma especial atenção, respondeu por estes dias: "A tais ameaças só se faz frente com outro conceito de democracia, mais completo, mais complexo". O que significa, desde logo, que uma democracia não se esgota em haver eleições de quatro em quatro ou de cinco em cinco anos, mas fazer sentir às pessoas - seja através de mecanismos mais diretos ou mais representativos - que são efetivamente escutadas e que a sua opinião conta para mais do que escolher os seus representantes. Esse é o desafio que todos nós temos pela frente: densificar a democracia, tornar a democracia mais democrata e participativa. Ao populismo responde-se com mais democracia. Ao medo não se responde com mais medo.
Donald Trump fez um verdadeiro golpe de prestidigitação nesta sua eleição. Conseguindo aparecer aos olhos dos seus compatriotas como um outsider e um elemento antissistema, ele que é um dos maiores beneficiários desse mesmo sistema (como se tornou evidente com as suas práticas fiscais..., que tão orgulhosamente exibiu ou até de como beneficiou do sistema de colégio eleitoral para ser eleito). Sim, este é um resultado que custa. Mas a inação é, certamente, a pior das respostas.
SECRETÁRIA-GERAL-ADJUNTA DO PS