Quem preferir as tricas políticas ou a espuma das coisas insistirá em focar-se na ligação entre Câmara de Setúbal e PCP, na polémica do acolhimento de refugiados ucranianos por associações pró-russas. Será tão vazia essa insistência como desastrosa foi a reação do secretário-geral do partido, Jerónimo de Sousa, desconfiando do "objetivo" de prejudicar o PCP neste incidente.
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O que está em causa transcende em muito questões partidárias e coloca dúvidas sérias que exigem respostas transparentes por parte das autoridades e do próprio serviço de informações de segurança. E é essencial nunca perder o foco sobre o que está no centro deste problema: os refugiados e a sua indispensável proteção.
A 2 de abril, a Associação dos Ucranianos em Portugal escreveu uma carta à secretária-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, alertando que haveria infiltrados pró-Putin em organizações não-governamentais (ONG) que apoiam ucranianos. Na comunicação, sublinhava os riscos de segurança dos refugiados e dos seus familiares na Ucrânia, e em tempo de guerra não pode ser considerada normal, por muito benévolas que sejam as explicações, a recolha de informações sobre o paradeiro de quem ficou no território invadido.
O problema foi de novo levantado, a 8 de abril, pela embaixadora da Ucrânia em Portugal. É na sequência dessas declarações que o autarca de Setúbal escreve ao primeiro-ministro. O primeiro diz ter solicitado esclarecimentos, o segundo nega e diz que foram pedidas responsabilidades quanto às declarações da diplomata. O tempo dará as respostas.
Mais uma vez, não se trata de polémicas políticas ou de um exercício de passa-culpas. A imediata disponibilidade que o país manifestou para acolher vítimas da guerra não pode ser um exercício atabalhoado e amador no acolhimento. Foram muitos os alertas para os perigos de ações desconcertadas de solidariedade e as exigências de uma articulação que impedisse riscos como o tráfico humano ou a exposição dos refugiados a novas ameaças. Portugal tem de dar garantias de que consegue assegurar a plena segurança e proteção dos cidadãos ucranianos. É por isso que nada pode ficar por esclarecer nesta matéria.