Das eleições ao combate à pobreza
Corpo do artigo
Tivemos, esta semana, dois acontecimentos relevantes enquanto campos de ação social e política transformadora da sociedade. No domingo, os resultados das eleições autárquicas. Ontem, dia 17, assinalou-se o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza. Ora, Portugal é um país com muita pobreza e quem estatisticamente surge em "risco de pobreza" também é pobre. O somatório destas duas categorias ultrapassa, há muito tempo, 1/5 do total da população.
Nas autárquicas, o PSD reforçou-se e ganhou as eleições. Todas as forças da Direita e da extrema-direita ganharam posições, independentemente de o Chega ter sido travado no passeio vitorioso que o seu líder e estrategas davam por adquirido. Os seus programas e o que disseram em campanha eleitoral mostram-nos que o neoliberalismo (económico e concetual) estará em força na gestão autárquica. Aqui chegados, lembremo-nos de que o Poder Local democrático foi um dos pilares fundamentais na construção do nosso Estado social que, embora débil, é fonte de dignidade das pessoas. Cumpriu esse papel quando interpretou os objetivos constitucionais e rechaçou a primazia do negócio.
A Esquerda, no seu conjunto, perdeu. Nenhuma das suas componentes ficou de fora dessa derrota, mesmo quando se realçam (e bem) alguns êxitos de resistência. Acresce que o centro-esquerda (uma parte do Partido Socialista contabilizado como Esquerda) está rendido ao liberalismo económico. Outras forças da Esquerda têm dificuldade em trabalhar coletivamente ações de resistência e, fundamentalmente, programas políticos que sejam alternativas mobilizadoras.
A orientação neoliberal do atual Governo toma a gestão de direitos fundamentais (saúde, ensino, proteção social, habitação ou acesso à água) como meras áreas de negócio. E trata os direitos do trabalho e as políticas migratórias como fatores subsidiários do aumento da "competitividade". Sempre pela via dos baixos salários, do trabalho sem direitos e de miseráveis condições de vida, designadamente dos imigrantes. Sempre a favor dos muito ricos e de oportunistas. O Governo disporá agora, como Montenegro enfatizou na campanha eleitoral, de maior lastro no terreno. A ação das forças da Esquerda nas autarquias será, assim, um reduto primordial, em muitas áreas, dignamente no combate à pobreza.
A EAPN, Rede Europeia Anti-Pobreza fez, no quadro das eleições autárquicas, um apelo em que identifica responsabilidades do Estado, mas onde também afirma que, "É nas freguesias, nos bairros, nas escolas e nos centros de saúde que se constroem soluções reais", no quadro de "um desafio coletivo e de cidadania, que requer intervenções territorializadas, promotoras da coesão social e territorial".
O futuro precisa de esperança e confiança a alimentá-lo. Entretanto, vai-se concretizando nas respostas aos problemas e desafios do presente contínuo. Não existe um amanhã melhor desligado do que estamos a viver hoje.