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O clima social não está para grandes festas. Mas também já quase não tem paciência para ouvir tantos discursos. E, sobretudo, sempre muito marcados pelas palavras cruzadas que os líderes políticos dos diferentes partidos vão trocando entre si.
Os tons dos discursos comemorativos dos 100 anos da República não fugiram à regra. Transpareciam a crispação que existe nas posições de uns e outros e não escondiam os temores de aonde nos pode levar esta tremenda crise económica e social sob a ameaça de uma ainda maior crise política. Padecendo deste hálito, as reportagens do dia deste 10 de Outubro centenário deram mais relevo aos discursos e à bateria de comentários sequentes do que aos próprios actos celebrativos. Por isso, achei, com grande propriedade, o título do editorial do "Diário de Notícias" de ontem: "A República dos discursos".
Não quero com isto dizer que comemorar o passado e, principalmente, os momentos que marcaram a nossa história não seja um imperativo de grande transcendência nacional. Sem história não há futuro que resista. Rememorar os acontecimentos da vida de um povo ajudam a cimentar identidade e a fomentar o sentido profundo de uma coesão, tão necessária para resistir aos tempos de crise e de descrença na possibilidade de construir outro futuro. Mas, creio, que esta comemoração e o conjunto dos eventos que a celebraram poderiam ter sido mais bem aproveitados num contraste de combate da crise.
Por todo o país realizaram-se diversos eventos de carácter cénico, musical, cultural pedagógico. Mas a interrogação que fica e que faço é esta: por que razões o estímulo destes não se sobrepuseram ao eco dos discursos de grande tensão política?
Causa-me alguma estranheza o pouco relevo transparecido ao reconhecimento público dos portugueses de dois acontecimentos: a inauguração, em Lisboa, do "Centro Champalimaud para o Desconhecido" e as várias cerimónias que, nas mais diversas autarquias, assinalaram inaugurações de novos edifícios escolares ou alguns velhos, mas completamente reparados.
O "Centro Champalimaud para o Desconhecido" ainda não começou a funcionar e é já uma obra de referência no campo de investigação científica mundial. Propiciar às nossas crianças e jovens 100 novas ou renovadas instalações escolares é um marco na celebração dos 100 anos da República. Mais acções e menos discursos convenceriam melhor o povo a acreditar num futuro de Portugal.