Está para breve a comissão parlamentar de inquérito (CPI) ao caso BES. O que se vai sabendo não augura nada de bom: um número excessivo de convocados, sem foco ou outro critério aparente que não seja o político. Demonstra-o a chamada, à última hora, dos responsáveis pelas operações de supervisão do Banco de Portugal (BdP) apenas, e tão-só, porque se soube que iriam abandonar aquela instituição para uma empresa de consultadoria. Ora, tal como na tropa se diz que os sargentos são o elemento crítico, também no tipo de operações que hão-de (devem!) estar sob escrutínio convocar os responsáveis directos por essas actividades parece não apenas lógico, como talvez permitisse esclarecer como tudo se passou na prática. A decisão da CPI de protelar os depoimentos dos presumíveis responsáveis pelo descalabro do BES evidencia uma outra coisa: falta no Parlamento o respaldo técnico que garanta a informação indispensável ao adequado exercício da função de deputado.
Corpo do artigo
Os "exercícios de aquecimento" para a dita CPI não auguram nada de bom: por uma conjugação de circunstâncias políticas, Carlos Costa parece recolher a unanimidade para vir a ser um dos "bombos da festa". Ao fim e ao cabo é independente ou, quando muito, visto como próximo de Cavaco Silva, o que ainda é pior - faz o pleno dos ódios. O PS, neste período de deriva entre lideranças (só?), insiste em acertar as contas de Constâncio numa terceira pessoa. O PSD quer sacudir a "água do capote" e sabe que, pelo seu estilo, o governador não irá revelar o que não deve ser revelado. O PC e o BE atiram sobre tudo o que mexe e que não mexe. Sobra o CDS que, por conveniência, alinhará com o PSD embora, no fundo, não se ralaria muito se algo de mais picante, das relações entre regulador e Governo, transpirasse.
Pouco importa que, no seu mandato, Carlos Costa tenha recuperado prestígio e dado protagonismo internacional ao BdP. Pouco importa a forma escrupulosa como o banco central foi acompanhando a situação da banca, contribuindo para minorar os problemas que se antecipavam. Foi, talvez, vítima da sua boa-fé, não antecipando até onde o desespero leva, respeitando quem o trairia, confiando quando devia suspeitar, protelando o inevitável. Foi, certamente, vítima de um modelo de nomeação da administração do BdP que não garante coerência nem consistência à equipa, prejudicando o alinhamento, a delegação de competências e o controlo. As obrigações decorrentes do envolvimento do Banco Central Europeu na gestão da crise ter-lhe-ão retirado tempo para acompanhar o funcionamento interno e acelerar a indispensável reorganização da instituição e das suas competências. Tudo isso será verdade. O que não obsta a que se faça um balanço positivo do seu mandato. Que as conveniências políticas se preparem para fazer dele um responsável - até agora, O responsável - pelo que se passou no BES explica porque os independentes se vão afastando da política e da coisa e causa públicas. Para sobreviver nesse mundo é preciso ter as costas quentes, protegidas. Um "outsider" pode tomar as decisões que só um "outsider" seria capaz que, no primeiro momento, será vítima do ajuste de contas.
Ter as costas quentes é conveniente, dá conforto. Até o frio e racional Passos Coelho o reconhece. A tal pressa dos analistas em tirarem conclusões, sem demasiados cuidados, ficou bem patente esta semana quando alguns louvaminheiros de serviço atribuíram ao período da troika uma subida de 13 lugares no ranking do Doing Business. Na verdade, essa é uma subida aparente, fruto de uma alteração de metodologia, tendo Portugal descido dois lugares. Mas estes analistas não contam. São dos nossos!
Percebo o incómodo do primeiro-ministro. O seu mais do que provável opositor continua em estado de graça, embora com cada vez pior imprensa. Com razão! António Costa tem estado calado há demasiado tempo. Ou talvez não! Quando fala, anuncia a reposição, na íntegra, dos salários da Função Pública enquanto critica a carga fiscal. A Quadratura do Círculo fora dela?